Número do Processo 13896.723044/2018-53
Contribuinte CIELO S.A – INSTITUICAO DE PAGAMENTO
Tipo do Recurso RECURSO VOLUNTARIO
Data da Sessão 18/09/2024
Relator(a) JOSE RENATO PEREIRA DE DEUS
Nº Acórdão 3302-014.811
Ementa(s)
Assunto: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofins
Período de apuração: 01/01/2014 a 31/12/2015
RECEITAS FINANCEIRAS. CONCEITO. LEGISLAÇÃO.
Nos termos dos arts. 17 e 18 do Decreto-lei nº 1598/77, as receitas e despesas financeiras são os juros, o desconto, a correção monetária prefixada, o lucro na operação de reporte e o prêmio de resgate de títulos ou debêntures, bem como as contrapartidas das variações monetárias, em função da taxa de câmbio ou de índices ou coeficientes aplicáveis, por disposição legal ou contratual, dos direitos de crédito do contribuinte e, ainda, os ganhos cambiais e monetários realizados no pagamento de obrigações.
Nos termos do art. 9º da Lei nº 9718/98, as variações monetárias dos direitos de crédito e das obrigações do contribuinte, em função da taxa de câmbio ou de índices ou coeficientes aplicáveis por disposição legal ou contratual serão consideradas como receitas ou despesas financeiras.
Somente pode ser considerada receita de serviço aquela auferida em decorrência de uma obrigação de fazer que gere uma utilidade material ou imaterial a terceiro. As receitas financeiras não decorrerem de nenhuma obrigação de fazer ou de qualquer esforço humano prestado a terceiro, apenas da remuneração do capital.
DESCONTO FINANCEIRO X FACTORING (FATURIZAÇÃO). ANTECIPAÇÃO DE RECEBÍVEIS DE VENDAS (ARV). RECEBIMENTO ANTECIPADO DE VALORES (RAV). DESÁGIO. NATUREZA JURÍDICA.
O desconto/deságio na antecipação de recebíveis tem natureza jurídica completamente distinta do desconto financeiro a que alude O Decreto-lei nº 1598/77. Os “descontos de títulos de crédito” se referem a situações nas quais o devedor entra em acordo com o credor para pagar antecipadamente uma dívida com vencimento futuro materializada em um cheque ou duplicata (títulos de crédito), mediante um desconto no valor de face. Para aquele que paga (devedor), trata-se de uma receita financeira; para aquele que recebe o pagamento com deságio, uma despesa financeira.
Na antecipação de recebíveis, tem-se uma situação totalmente diferente; quem toma a iniciativa em constituir relação jurídica semelhante à que se discute neste processo não busca quitar uma dívida com desconto, mas sim obter um adiantamento de suas receitas para cumprir com obrigações ou por qualquer outra razão que o leve a necessitar, de imediato, de capital. Trata-se de relação de fomento mercantil, mediante a contratação de um serviço disponibilizado, de forma contínua e habitual, por empresa que se dispõe a assumir o risco de receber/cobrar um crédito com vencimento futuro mediante uma “taxa” (deságio), que corresponde à diferença entre o valor do crédito e o valor efetivamente pago.
O contrato de factoring é aquele pelo qual uma das partes (faturizadora) presta a outra (faturizado) um serviço de administração de crédito, garantindo o pagamento das faturas, gerenciando e cobrando os créditos cedidos pelo faturizado e assumindo os riscos/perdas pelo inadimplemento do devedor.
Nos termos do art. 15, § 1º, inciso III, alínea “d”, da Lei nº 9.249/1995, e do art. 14, inciso VI, da Lei nº 9.718/1998, factoring é a atividade de prestação cumulativa e contínua de serviços de assessoria creditícia, mercadológica, gestão de crédito, seleção de riscos, administração de contas a pagar e a receber, compra de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços.
CONCEITO DE ATIVIDADES TÍPICAS. CONTRATO SOCIAL. OBJETO SOCIAL.
No julgamento do Recurso Extraordinário nº 659.412/RJ, com repercussão geral reconhecida, foi firmada a tese de que é constitucional a incidência da contribuição para o PIS e da COFINS sobre as receitas auferidas com a locação de bens móveis ou imóveis, quando constituir atividade empresarial do contribuinte, considerando que o resultado econômico dessa operação coincide com o conceito de faturamento ou receita bruta.
Neste mesmo precedente, restou esclarecido que a expressão “atividades típicas” não está adstrita à ideia daquilo que conta nos respectivos objetos sociais, mas sim o desempenho habitual das atividades econômicas e, portanto, a mera distinção das receitas da atividade típica da empresa, enquanto atividade profissional e organizada da empresa, distinguindo das receitas meramente eventuais ou acidentais, como as financeiras. A “atividade típica” não precisa necessariamente constar do objeto social, bastando que seja uma atividade empresarial importante da empresa.
É possível que a pessoa jurídica se dedique habitualmente a outras atividades ou outros negócios que não estejam relacionados no Estatuto Social. Nestes casos, de dissonância entre a realidade efetiva e os atos constitutivos, por atraso na sua atualização ou por qualquer outro motivo, os fatos apurados na realidade podem determinar a desconsideração dos documentos de constituição da pessoa jurídica para a determinação do que seja resultado operacional, decorrendo essa desconsideração das circunstâncias verificadas em cada situação concreta. Dentre tais circunstâncias, podem ser citadas a repetição habitual de negócios e a organização empresarial para a prática de uma atividade ou de um tipo de negócio, isto é, a manutenção de recursos humanos, materiais, financeiros ou de outras espécies empregados em atividades ou negócios não previstos estatutariamente.
CONCEITO DE SERVIÇOS. CONCEITO DE FATURAMENTO. ISS X PIS/COFINS.
Conforme discutido no Recurso Extraordinário nº 659.412/RJ, no tocante ao ISS, somente aqueles serviços que estiverem previstos em lei complementar federal é que poderão ser tributados pelo imposto municipal. Já quanto ao PIS/COFINS, inexiste esse tipo de condicionamento, de modo que é inteiramente desnecessário estar uma atividade inserida em tal lei complementar para ser compreendida como verdadeiro serviço e ser tributada por essas contribuições. Mesmo que se considerasse a atividade empresarial típica do contribuinte seja estritamente de prestação de serviços, seu faturamento poderá englobar outros serviços além daqueles previstos na lista anexa à LC nº 116/03.
RECEITAS FINANCEIRAS. ALÍQUOTA ZERO.
As receitas advindas da atividade empresarial rotineira do contribuinte constituem sua receita bruta, nos termos do inciso IV do art. 12 do Decreto-Lei nº 1.598/1977 e, por conseguinte, não deve ser aplicada a alíquota zero prevista nos Decreto nº 5.164/2004 e 5.442/2005, os quais abarcam apenas as receitas financeiras estranhas à atividade empresarial.
A jurisprudência do STJ se firmou no sentido de que, para as receitas que dizem respeito ao faturamento da empresa, não se aplicam as prescrições do art. 1º do Decreto nº 5.442/2005, que reduzem a zero as alíquotas das contribuições.