Há pelo menos três decisões contrárias à dedução de perdas da base de cálculo do Imposto de Renda e da CSLL.
As distribuidoras de energia têm perdido no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) a disputa travada com a Receita Federal sobre a tributação de perdas com o furto de energia elétrica. Há pelo menos três decisões contrárias à dedução desses valores da base de cálculo do Imposto de Renda (IRPJ) e da CSLL. Todas da 2ª Turma da 4ª Câmara da 1ª Seção.
Um dos casos foi julgado ontem. Os conselheiros decidiram manter uma autuação fiscal recebida pela Light Serviços de Eletricidade. O processo tinha um ponto novo: a apresentação de um boletim de ocorrência sobre o furto. A turma já havia analisado duas cobranças semelhantes. Uma delas da EDP Espírito Santo Distribuição de Energia (processo nº 15586.720168/2018-14). Manteve cobrança de IRPJ e CSLL e afastou a de PIS e Cofins.
No caso da Light, a fiscalização considerou que as chamadas “perdas não técnicas” deveriam ter sido adicionados ao resultado para apuração do lucro real e cálculo do IRPJ e CSLL. Pelo Regulamento do Imposto de Renda, elas podem ser deduzidas em casos de furto ou fraude.
O assunto foi objeto de diferentes soluções de consulta da Receita Federal. E em 2017 foi destacado que deve haver queixa-crime para comprovação de furto, o que já era previsto pelo Regulamento do Imposto de Renda.
No processo, referente aos anos de 2013 e 2014, a companhia alega que fez um boletim de ocorrência. Porém, a fiscalização considerou o documento “vago e genérico” e alegou que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) compensa os furtos na tarifa (processo nº 16682.721141/2018-13).
“A regra é o furto”, afirmou em sustentação oral o advogado Luiz Paulo Romano, do Pinheiro Neto Advogados, referindo-se a algumas áreas do Rio de Janeiro. Em 2013 e 2014, o furto, acrescentou, correspondeu a 20% da energia comprada da geradora. A empresa, segundo ele, aumentou seu investimentos em tecnologia, mas não conseguiu alterar a situação.
Já o procurador Rodrigo Burgos, da Fazenda Nacional, ponderou que a situação de violência no Rio de Janeiro é compensada na tarifa pela Aneel e a questão é considerada regulatória e não fiscal. “Não dá para resolver o problema da violência no Rio de Janeiro com a dedução de valores de furto de energia.”
No julgamento, o voto da relatora, conselheira Júnia Roberta Gouveia Sampaio, representante dos contribuintes, foi favorável à Light. Ela afirmou que é possível criar mecanismos para evitar furtos no varejo, o que não acontece no setor de energia. “As cidades brasileiras possuem regiões onde o poder público não chega, que também precisam ser abastecidas por energia”, disse.
A Aneel, segundo a relatora, considera as perdas na composição da tarifa, mas o modelo usa apenas o índice de violência, deixando de lado casos de corrupção. Ainda que o inquérito policial seja necessário, acrescentou, a Light cumpriu o requisito com o boletim de ocorrência.
O conselheiro Marcos Rogério Borges, representante da Fazenda, porém, divergiu. Em seu voto, disse que as perdas técnicas e não técnicas compõe o preço. Então, as distribuidoras não teriam prejuízo. Ele também questionou o boletim de ocorrência. “Achei genérico demais. É um ofício relatando para a autoridade policial”, afirmou ele, acrescentando que considera difícil combater os furtos, mas entende que a empresa tem que se articular para isso.
Apesar da decisão de mérito, o processo voltou para a primeira instância. A Delegacia Regional de Julgamento terá que verificar valores de prejuízo fiscal que podem reduzir a cobrança. Por isso, ainda não cabe recurso. Para levar o caso à Câmara Superior, porém, a empresa vai precisar de precedente julgado em sentido contrário.
Valor Econômico – Por Beatriz Olivon – 11 de março de 2020