O mês de agosto ficou marcado pelas mudanças na jurisprudência da Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), em razão da nova composição das turmas. Entre os principais destaques estão as alterações nos entendimentos sobre a não incidência das contribuições previdenciárias sobre o bônus de contratação (hiring bonus) e o direito a créditos de PIS/Cofins sobre despesas com frete de produtos acabados.
Além disso, as turmas também mudaram os entendimentos sobre qualificação da multa de ofício em casos de amortização de ágio e incidência de contribuições previdenciárias sobre Participação nos Lucros e Resultados (PLR) paga a diretores não empregados.
Com a gestão do presidente Carlos Henrique de Oliveira, as turmas da Câmara Superior sofreram mudanças em sua composição e voltaram às suas atividades presenciais, até então prejudicadas pela adesão dos conselheiros à mobilização dos auditores fiscais pela regulamentação do bônus de eficiência. Foram alterados, principalmente, os conselheiros representantes da Fazenda Nacional. A mudança ficou ainda mais perceptível quando o presidente e a vice-presidente do conselho passaram a participar das turmas.
Contribuição previdenciária sobre o hiring bonus e PLR
Nesta semana, a 2ª Turma da Câmara Superior realizou as sessões de julgamento de forma presencial, com a presença de um novo conselheiro fazendário na turma – Eduardo Newmann de Mattera Gomes – e a participação do presidente do Carf, Carlos Henrique de Oliveira.
Em uma das mudanças de entendimento, o colegiado considerou que não incidem contribuições previdenciárias sobre o bônus de contratação (hiring bonus), uma vez que a verba não teria natureza remuneratória. Tratam-se dos processos 16327.001665/2010-78 e 16327.001666/2010-12, envolvendo o Banco Pine.
A decisão foi por unanimidade, no entanto, houve empate na conclusão dos votos: metade dos conselheiros entendeu que não incide contribuição previdenciária sobre o bônus apenas no caso concreto, em razão de a fiscalização não ter demonstrado que os pagamentos foram em decorrência da prestação de serviço. A outra metade, que teve a posição vencedora por desempate pró-contribuinte, entendeu que o bônus não teria caráter remuneratório por si só.
Em outro caso, após aplicação do desempate pró-contribuinte, o colegiado mudou de entendimento e decidiu que não incide contribuição previdenciária sobre os pagamentos a título de Participação nos Lucros e Resultados (PLR) feitos a diretores não empregados. Trata-se do processo 16682.720290/2014-23.
O entendimento que prevaleceu foi de que o artigo 2º da Lei 10.101/2000, que define que os pagamentos de PLR serão objeto de negociação entre a empresa e seus “empregados”, abrange também trabalhadores não empregados. O artigo 28, parágrafo 9º da Lei nº 8.212/91 estabelece que não integram o salário de contribuição a Participação nos Lucros ou Resultados da empresa, desde que pagas ou creditadas de acordo com a legislação.
Crédito de PIS/Cofins sobre despesas com frete de produtos acabados
A 3ª Turma da Câmara Superior, ao julgar o processo 11080.005380/2007-27, mudou de entendimento e permitiu o aproveitamento de créditos de PIS e Cofins sobre despesas com frete de produtos acabados, por considerar que os gastos são essenciais para a atividade econômica da empresa, conforme os critérios de essencialidade e relevância definidos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no âmbito do Tema 779. A decisão se deu por sete votos a três e é considerada uma vitória relevante dos contribuintes.
A posição representa uma mudança de entendimento do colegiado, em razão da nova composição. Sob a gestão do presidente Carlos Henrique de Oliveira no Carf, os conselheiros Liziane Angelotti Meira, Rosaldo Trevisan e Vinícius Guimarães estrearam na Câmara Superior. Por conta da participação do presidente do conselho, a vice-presidente do tribunal, Ana Cecília Lustosa, também participou da sessão.
Outra mudança se deu na decisão da turma que afastou a responsabilidade solidária dos devedores solidários de uma empresa autuada por suposta fraude. Os conselheiros entenderam que para imputar a responsabilidade deveriam existir provas cabais das condutas individualizadas. A decisão se deu por voto de qualidade, isto é, quando o voto do presidente tem peso duplo.
Antes, o colegiado considerava, por maioria de votos, que a mera prática de infrações à lei tributária e penal seria o suficiente para atribuir a responsabilidade aos devedores solidários. Trata-se do processo 13819.723481/2014-66.
Qualificação da multa em casos de ágio
Já a 1ª Turma da Câmara Superior, que realizou sessões presenciais na primeira semana de agosto, consolidou ainda mais seu entendimento nas matérias de amortização de ágio. O colegiado já vem aplicando o entendimento de que a fiscalização precisa comprovar que houve artificialidade e falta de propósito negocial nas operações que geraram o ágio para que o contribuinte não tenha direito à amortização.
No entanto, a turma mudou seu entendimento quanto à qualificação da multa de ofício em 150% nos casos em que a artificialidade foi demonstrada e a amortização não é permitida. Agora, os conselheiros entendem que a simples interposição de sociedade para amenizar os efeitos fiscais não caracteriza dolo, fraude ou simulação, necessários para que a multa seja qualificada. Trata-se do processo 16561.720017/2015-56.
O ágio é um valor gerado em operações de reestruturação societária. Quando uma empresa adquire outra que sofre uma valorização, a adquirente recebe um valor superior ao patrimônio líquido da companhia adquirida. Esse valor superior é chamado de ágio, que pode ser amortizado, isto é, deduzido da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. No entanto, este ainda é um tema muito polêmico que gera uma série de autuações fiscais contra grandes grupos econômicos.
Fonte: JOTA/MARIANA RIBAS – 31/09/2022