Câmara destrava 2º projeto da reforma e joga pressão sobre o Senado
31 de outubro de 2024
A conclusão da votação do PLP 108/2024 pela Câmara joga pressão sobre o Senado para a conclusão da regulamentação da Reforma Tributária do consumo ainda este ano. Antes, a perspectiva dos senadores era de finalização apenas do PLP 68/2024 até dezembro. No entanto, com o destravamento do segundo projeto, os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), devem trabalhar para encerrar a gestão com suas digitais em ambas as matérias.
Já tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado o PLP 68/24, que é o principal projeto de regulamentação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), da Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto Seletivo (IS). Agora, com a chegada do PLP 108 no Senado, a tendência é que o relator seja o mesmo do projeto principal, Eduardo Braga (MDB-AM), mas a tramitação ainda precisa ser discutida assim que chegar oficialmente na Casa. O PLP 108 trata, entre outros pontos, do Comitê Gestor, responsável pela fiscalização do IBS, e do julgamento administrativo do tributo.
PLP 108: o que a Câmara aprovou
A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (30/10) os destaques do PLP 108. As principais alterações na versão do texto que vai ao Senado estão relacionadas ao ITCMD. O relator, deputado Mauro Benevides (PDT-CE), retirou a incidência do tributo sobre a distribuição desproporcional dos dividendos e sobre planos de previdência privada.
Em relação à distribuição desproporcional, o texto anterior previa a cobrança do imposto como forma de prevenir um planejamento tributário por meio do qual familiares realizavam doações entre eles através da distribuição de dividendos. Especialistas, entretanto, apontavam que o texto abria a possibilidade de o ITCMD ser cobrado em situações em que a distribuição foi regular. Em relação aos planos de previdência, o texto anterior previa a incidência do ITCMD sobre o Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) e Plano Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL), com exceção daqueles aportes com mais de 5 anos – que seriam isentos. A incidência do imposto sobre a previdência privada, no entanto, ficou de fora do texto aprovado, após o relator incorporar destaque baseado em emenda do deputado Domingos Neto (PSD-CE).
Audiências públicas no Senado
Enquanto a Câmara aprovou os destaques ao PLP 108, o Senado iniciou esta semana as audiências públicas sobre o PLP 68, dando início oficial às negociações. Com isso, a expectativa de aprovação ainda este ano fica mais palpável.
No Senado, o PLP 68/24 tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Após o fim das eleições municipais, as atividades e negociações foram oficialmente iniciadas. Na terça-feira (29/10), o colegiado realizou a primeira audiência pública, que consistiu na apresentação da reforma tributária pelos representantes do Ministério da Fazenda Dario Durigan, secretário-executivo, e Bernard Appy, secretário extraordinário da reforma.
Na quarta-feira (30/10), foi realizada a audiência pública sobre os impactos da reforma no setor produtivo. Foram levantados temas como a necessidade da exclusão das bebidas açucaradas da incidência do Imposto Seletivo e a possibilidade de se compensar o crédito gerado com outros tributos. Também foi criticada a necessidade de comprovação do recolhimento do tributo como requisito para a disponibilização do crédito ao adquirente
Na quinta-feira (31/10), a audiência pública teve como foco os impactos sociais da reforma, com medidas como o cashback e a Cesta Básica Nacional. Em geral, os setores elogiaram o texto da forma como foi feito, mas sugeriram mudanças como a possibilidade de compensação de crédito com outros tributos e, também, a inclusão de alguns alimentos processados na cesta básica.
Além disso, na terça-feira, foi apresentado o relatório final do Grupo de Trabalho da Reforma Tributária na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE). A ideia é que as sugestões possam ser acolhidas ou não por Eduardo Braga.
Impacto da reforma
Quem perde e quem ganha com a reforma?
É uma tarefa complexa apontar “quem ganha” e “quem perde” com a reforma tributária. Elementos como a heterogeneidade de setores e a incerteza sobre as alíquotas tornam difícil apontar tendências. Em geral, porém, é possível dizer que setores com cadeias longas, como a indústria, tendem a se beneficiar, já que trocarão diversos tributos por dois, e terão amplo creditamento. Empresas com alto dispêndio em mão de obra e prestação de serviço direto ao consumidor final, por outro lado, podem sair prejudicadas, a não ser que estejam sujeitas a redução de alíquota ou regime diferenciado.
Para explicar esse cenário, o JOTA elaborou uma análise sobre o impacto da reforma tributária em cada setor.
PLP 68 limita acesso ao fundo de compensação, afirma parecer
Parecer do professor Tacio Lacerda Gama realizado a pedido da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca) mostra que a proposta de regulamentação do Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais (FCBF) apresenta problemas. Entre eles estão a existência de limitações para acesso ao fundo e a concessão do prazo de apenas um ano para requerimento, pelos contribuintes, da compensação. Lacerda Gama é professor da PUC-SP e do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET) e presidente do Instituto de Aplicação do Tributo (IAT)
Criado pela Emenda Constitucional 132/2023, o fundo visa compensar os contribuintes pela redução de benefícios fiscais do ICMS com a mudança no sistema. A regulamentação é discutida no PLP 68/2024, em tramitação no Senado Federal.
O parecer aponta, por exemplo, que o projeto traz limitações indevidas de natureza administrativa, tributária e financeira para acesso ao fundo. No primeiro caso, o projeto teria concedido à Receita Federal uma margem de exercício de competência regulatória que “pode ter o efeito de mitigar o amplo dever de compensar os danos causados pela revogação de benefícios fiscais”. O artigo 685 do PLP 68/2024 define, por exemplo, que compete à Receita estabelecer a forma e as informações dos requerimentos de habilitação; expedir normas complementares relativas ao cumprimento das exigências a que estão sujeitos os requerentes para sua habilitação; e analisar os requerimentos de habilitação; entre outras atribuições.
Na área tributária, o estudo aponta a ausência de critérios para quantificar o efetivo prejuízo que a revogação dos benefícios causará aos contribuintes. Segundo o parecer, há ainda confusão a respeito da natureza jurídica da compensação, que abre espaço, indevido, para tributação, por meio de IRPJ e CSLL, e até de CBS e IBS, dos valores. O parecer conclui que a compensação é uma indenização e que, portanto, não deverá entrar na base de cálculo desses tributos. No que diz respeito à restrição financeira, o texto critica ainda o fato de não haver, no projeto, regulamentação sobre a necessidade de complementação do fundo, pela União, em caso de insuficiência de recursos.
O artigo 390, parágrafo 3º do PLP 68, define que o direito para pleitear a compensação é de um ano desde o “vencimento do prazo para transmissão da escrituração fiscal”, que envolve a apuração do crédito correspondente. O professor Lacerda Gama avalia que esse prazo é incompatível com o prazo decadencial de cinco anos definido pelo Código Tributário Nacional (CTN).
A Abrasca pretende debater os resultados do estudo em audiência pública que será realizada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado para discutir justamente o fundo de compensação e o novo modelo de desenvolvimento regional. Entre os convidados estão o presidente-executivo da entidade, Pablo Cesário, e o secretário Extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy.