O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais voltou a reconhecer, no último mês, a possibilidade de apropriação de créditos de PIS e Cofins sobre despesas de publicidade e propaganda. Essa decisão vem se somar a outras, também favoráveis, o que já nos permite delinear as motivações do Carf ao analisar a matéria, assim como o âmbito de aplicação do que se tem decidido no tribunal administrativo.
O caso em questão, das Lojas Insinuante, atual Ricardo Eletro (Processo Administrativo 10540.721182/2016-78), era acompanhado com expectativa pelos contribuintes do setor varejista, uma vez que em primeira instância administrativa a empresa já havia obtido decisão favorável quanto ao reconhecimento dos créditos sobre despesas de publicidade e propaganda. Cabia ao Carf, assim, fazer o reexame necessário dessa decisão.
Os julgadores do Carf, seguindo a posição adotada no julgado de primeira instância, decidiram que a empresa varejista poderia aproveitar os créditos de PIS e Cofins decorrentes de despesas de publicidade e propaganda.
No caso concreto, foi essencial para o entendimento do Carf em favor do contribuinte o fato de que este possuía em seu objeto social a prestação de serviços de publicidade e propaganda, auferindo receitas em razão desta atividade, ainda que não de forma preponderante.
Como restou claro na sessão de julgamento, a Ricardo Eletro realiza ações de marketing para promover os produtos de seus fornecedores que são comercializados em seus estabelecimentos, sendo tal prestação de serviços remunerada pela chamada verba de propaganda cooperada (VPC).
Sendo a VPC uma receita operacional decorrente da atividade de prestação de serviços de publicidade e propaganda, tributável pelo PIS e pela Cofins, concluiu-se, por maioria de votos, que as despesas incorridas nesta atividade deveriam ser consideradas como insumos, em razão de sua essencialidade, nos termos definidos pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do leading case (Recurso Especial 1.221.170).
Como já mencionado, não é a primeira vez que o Carf reconhece a possibilidade de apropriação de créditos de PIS e da Cofins sobre os gastos com publicidade e propaganda, para empresas prestadoras de serviços.
Em um dos casos analisados pelo tribunal administrativo (Processo Administrativo 19311.720352/201411), foi conferido o direito a créditos de PIS e de Cofins sobre os gastos com propaganda, marketing e assessoria à Natura Inovação, empresa do Grupo Natura prestadora de serviços que tinha em seu objeto social, entre outros, pesquisa de mercado e desenvolvimento de novas tecnologias e produtos.
Nesta situação a empresa autuada também auferia receitas com essa prestação de serviços, em contratos firmados com a Natura Cosméticos. O Carf reputou, na ocasião, ser “incontroverso que o escopo dos serviços prestados pela recorrente envolve, diretamente, atividades de marketing, propaganda, bem como outras atividades relacionadas à promoção e ao lançamento dos produtos desenvolvidos”.
Da mesma forma, ganhou destaque o caso da Visa (Processo Administrativo 19515.721360/2017-23), instituidora de arranjos de pagamento que tem, em seu objeto social, a previsão de prestação de serviços de assistência e condução das atividades e ações gerais de marketing relacionadas à divulgação e/ou promoção dos produtos da marca homônima, atividade pela qual é remunerada por seus clientes (emissores e credenciadores de cartões de débito e crédito).
Com a constatação de que a empresa tem por atividade-fim o desenvolvimento e o fortalecimento da sua própria marca, com o objetivo de incrementar a emissão de cartões com a bandeira “Visa” pelos seus clientes (emissores e credenciadores), o Carf admitiu a apropriação de créditos de PIS e Cofins sobre a aquisição de serviços de marketing.
Diante destas decisões, é possível determinar alguns elementos comuns que caracterizariam o entendimento que o Carf vem adotando aos analisar a possibilidade de se considerar como insumos as despesas de publicidade e propaganda, para fins de creditamento pelo PIS e pela Cofins.
Em suma, os julgadores verificam se o contribuinte possui a prestação de serviços de publicidade e propaganda em seu objeto social, e se aufere receitas com a prestação dessas atividades para terceiros, as quais devem ser incluídas nas bases de cálculo do PIS e da Cofins. Além disso, é indispensável a demonstração da essencialidade e/ou relevância de tais despesas para o desenvolvimento da atividade desempenhada pelo contribuinte, como definido pelo STJ no leading case.
Reconhece-se, assim, que as despesas com publicidade e propaganda são insumos à prestação dos serviços dessa natureza. Desta forma, o caso Ricardo Eletro, recentemente julgado, não pode ser entendido como uma carta branca do Carf para que o setor de varejo possa reconhecer créditos de PIS e Cofins sobre toda e qualquer despesa incorrida. Tanto é assim que, nesse mesmo julgamento, por unanimidade, não se reconheceu a possibilidade de tomada de créditos de PIS e Cofins sobre as despesas com taxas de administração de cartões de débito e crédito, sob a alegação de ausência de previsão legal para apropriação de créditos de insumos pelos varejistas.
Por Luana Maluf P. S. Robles, Natalie Matos Silva e Ana Paula Lui
Luana Maluf P. S. Robles é advogada do escritório Mattos Filho.
Natalie Matos Silva é advogada do escritório Mattos Filho.
Ana Paula Lui é sócia do escritório Mattos Filho.
Revista Consultor Jurídico, 15 de fevereiro de 2020.
https://www.conjur.com.br/2020-fev-15/opiniao-creditos-piscofins-publicidade-otica-carf