Carf terá novas súmulas e inteligência artificial em 2025, diz presidente
Equipe JOTA PRO Tributos
03/01/2025
Em entrevista ao JOTA, Carlos Higino comenta os planos de gestão para 2025, com foco em súmulas, plenário virtual e inteligência artificial
Em continuidade aos esforços para aumentar a celeridade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), novas súmulas sobre temas frequentes no tribunal devem ser aprovadas em 2025, sem deliberação em pleno. O novo Regimento Interno do Carf (Ricarf) permite que os temas sejam apreciados diretamente nos colegiados, e a ideia do presidente do conselho, Carlos Higino Ribeiro de Alencar, é manter um fluxo contínuo de aprovações no próximo ano, de modo que, no longo prazo, os julgamentos possam se concentrar apenas em discussões novas.
Em entrevista exclusiva ao JOTA, o presidente comentou como trabalhará para que a operação deslanche e os processos sejam resolvidos com maior rapidez. De acordo com Higino, para garantir que matérias costumeiras no Carf sejam transformadas em súmulas, ainda é necessário uma pesquisa sobre decisões já publicadas pelas turmas. Esta é uma das prioridades do presidente para 2025.
Higino pretende “analisar quais os casos com mais processos repetitivos, verificar se já há uma jurisprudência majoritária e sumular, para resolver vários casos”. Em sua avaliação, existe uma lacuna na Justiça como um todo e nos tribunais administrativos com relação à análise de gestão do acervo.
Já há uma lista de assuntos sugeridos em processo de revisão na Receita Federal, o que indica que o Carf pode começar 2025 com novas aprovações nos colegiados. A expectativa é que temas aduaneiros estejam em peso entre as propostas.
Celeridade e pacificação
Em 2024, o Carf fez um esforço concentrado para a análise de temas que pudessem virar súmulas. Foram realizadas duas rodadas de votação: a primeira, em junho, aprovou 14 novos enunciados . A segunda, em setembro, gerou outros 16 temas. Para o presidente do conselho, a consolidação dos entendimentos pacificados foi fundamental para a redução do estoque, motivo pelo qual pretende dar continuidade a esse processo de forma permanente.
Era prevista uma terceira votação de súmulas ainda em dezembro, mas devido à demora com a burocracia que antecede as votações, segundo o presidente, a ideia ficou para depois do recesso. Ele explicou que, após o levantamento interno de assuntos pacificados, a proposta é encaminhada à Divisão de Uniformização e Jurisprudência, que realiza a revisão e retorna para debate interno. Depois, é enviada ao fisco e à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e, só então, volta ao Carf para ser votada.
Este ano, mesmo com um início conturbado por conta da greve dos auditores fiscais (de novembro de 2023 a fevereiro de 2024), o Carf julgou, em valores, cerca de R$ 800 bilhões. O acervo atual chega a quase R$ 900 bilhões. Higino defende a diminuição do valor, e não a sua normalização. “A ideia é tentar jogar meio trilhão [de reais] para o ano que vem para ir reduzindo [o estoque]”, afirma.
O presidente citou que já há estudos que indicam que o Carf entrará em um fluxo melhor se conseguir reduzir o estoque para valores entre R$ 250 bilhões e R$ 350 bilhões.
Greve no horizonte
A direção do Carf se vê novamente diante da possibilidade de ser impactada com a paralisação dos auditores da Receita Federal que aderiram à greve, em novembro, para pedir reajuste salarial. Em dezembro, conselheiros da Fazenda enviaram uma carta ao ministro Fernando Haddad, e outra ao presidente do Carf comunicando a possibilidade de adesão ao movimento. Mas antes que as sessões fossem interrompidas por falta de quórum, a duas semanas do recesso, o presidente do conselho garantiu que os processos dos conselheiros que estavam em concordância com a paralisação fossem apenas retirados de pauta.
Como não participa diretamente das negociações e não houve nenhum procedimento oficial por parte do governo, a expectativa é de que as negociações se resolvam ao menos até o fim do recesso do tribunal administrativo, em 20 de janeiro.
Higino se considera otimista e espera conseguir resolver essa questão até a retomada das sessões, mas não descarta a possibilidade de uma paralisação após esse momento. “O governo ainda não enviou o projeto de lei com os aumentos (…). O Congresso entra em recesso e são mais 120 dias. Então se for mandar medida provisória, a decisão final vai ficar lá para maio”, disse.
Plenário virtual
Além das votações de súmulas, outra medida que contribuiu para aumentar a celeridade no Carf foi a implementação do plenário virtual , em agosto. Nesta modalidade, os conselheiros têm cinco dias para depositar os votos em um ambiente online e público. Diferentemente dos tribunais judiciais, o conselho criou um filtro de valores para garantir que os casos mais complexos sigam sendo analisados no plenário síncrono, ou seja, presencial ou híbrido.
Com isso, o Carf estabelece que são necessariamente julgados no plenário síncrono da 1ª Seção os processos que ultrapassem R$ 60 milhões. Na 2ª Seção, acima de R$ 7,5 milhões, e na 3ª Seção a partir de R$ 30 milhões, considerado o valor principal e as multas. O mesmo vale para os processos de representação de nulidade. Ou seja, os processos abaixo desses valores podem ser colocados em plenário virtual.
Higino conta que o plenário virtual do Carf foi pensado a partir de outras experiências e com o diálogo com a advocacia, buscando “aperfeiçoar onde surgiram problemas de outros plenários virtuais”. O presidente não desconhece a crítica dos advogados com relação ao uso da sistemática e a possibilidade de queda na qualidade dos debates, mas rebate que o advogado “militante” no Carf “entendeu e aceitou bem” o modelo. “Sempre vai ter um crítico ou outro”, diz.
Ainda segundo o presidente, o plenário virtual vai ajudar na redução de custos de deslocamento de conselheiros para participação nas sessões e na diminuição do tempo médio de tramitação dos processos nas turmas ordinárias, que atualmente levam cerca de três anos para serem resolvidos.
Inteligência artificial
A partir de janeiro de 2025, o Carf começa a trabalhar com auxílio de inteligência artificial. Batizada de Iara (Inteligência Artificial em Recursos Administrativos) e desenvolvida pelo Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), a medida foi pensada para auxiliar no julgamento dos casos, analisando o cumprimento de requisitos, elaborando resumos e até indicando a jurisprudência e legislação possível de ser aplicada.
A IA será treinada com bases e parâmetros do próprio Carf de cerca de 500 mil julgamentos, súmulas do conselho e entendimentos do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF). Um de seus focos iniciais é a redução no tempo de tramitação dos processos, de seis anos para um ano, especialmente com matérias repetitivas e com entendimento já consolidado no tribunal administrativo.
O sistema precisa ser homologado e suas diretrizes devem ser publicadas em breve em uma portaria. De acordo com Higino, o ato deve trazer as regras de como os conselheiros podem utilizar a IA. Ele destaca que a tecnologia não vai substituir o julgador: “não é um robô para decidir os processos. Todo o processo aqui vai ser julgado por um conselheiro, e a responsabilidade será dele”, afirma.
O presidente explica que a Iara também não vai sugerir voto para os julgadores, mas funcionará como uma assistente que fornecerá subsídios técnicos para a análise dos casos.
Mudança de sede
Há ainda novidades para o segundo semestre de 2025, como a mudança de sede do Carf. Atualmente localizado no Setor Comercial Sul, em Brasília, o conselho deve ir para um dos prédios do Ministério da Fazenda, no Setor de Autarquias Sul, que está passando por reformas. A troca acontece a partir da ideia de racionalização do espaço considerando que, desde a pandemia, diversas áreas do Carf foram autorizadas a trabalhar remotamente. Além disso, Higino considera que o local será mais seguro e ajudará com a redução de custos com estacionamento e deslocamento para alimentação.
Diane Bikel
Repórter
Fernanda Valente
Repórter