STF vai reiniciar análise sobre crédito de PIS e Cofins na compra de recicláveis
José Higídio
21 de junho de 2024,
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, pediu destaque, nesta sexta-feira (21/6), e suspendeu o julgamento no qual o Plenário reanalisa uma decisão que validou créditos de PIS e Cofins na compra de insumos recicláveis e discute sua modulação.
Em 2021, Supremo autorizou uso de créditos de PIS e Cofins na compra de insumos recicláveis
Com isso, o caso será reiniciado em sessão presencial, ainda sem data marcada. Até então, a análise ocorria no Plenário Virtual, com término previsto para a próxima sexta (28/6).
Antes do pedido de destaque, três ministros haviam se manifestado. Gilmar Mendes e o próprio Alexandre votaram por manter a decisão e modular seus efeitos. Já Dias Toffoli votou por alterar parte do acórdão original e sugeriu modulações diferentes, a depender da aprovação ou não de sua tese.
Contexto
Em 2021, o STF declarou inconstitucionais dois dispositivos da Lei do Bem, que prevê alguns incentivos fiscais. O artigo 47 proibia o uso de créditos de PIS e Cofins, no regime não cumulativo, por empresas que adquirissem determinados insumos recicláveis. Já o artigo 48 suspendia a incidência dos mesmos tributos na venda desses insumos a essas empresas.
Ou seja, na ocasião, a Corte autorizou o uso dos créditos na compra de sucata e invalidou a suspensão. Os ministros entenderam que os dois artigos, na tentativa de fomentar o setor, elevavam a carga tributária dos produtos reciclados de forma artificial.
Após o julgamento, foram apresentados diversos embargos de declaração. A União, por exemplo, pediu a modulação dos efeitos da decisão, no mínimo a partir da data do julgamento de repercussão geral.
Já a Associação Nacional dos Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis (Ancat), que atua como amicus curiae no processo, alegou que, além da falta de modulação, o acórdão ignorou a possibilidade de avaliar o artigo 48 como uma isenção fiscal.
Da mesma forma, a Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast) argumentou que a decisão tornou a matéria-prima mais onerosa e que os valores antes isentos de tributação seriam repassados ao preço final dos insumos reciclados.
Voto do relator
Gilmar, relator do caso, votou por manter a decisão de 2021, mas modular seus efeitos a partir do exercício (ano) seguinte à data de publicação da ata de julgamento dos embargos. Seu entendimento foi seguido por Alexandre.
Ele reconheceu que o acórdão impacta o planejamento tributário de milhares de empresas do ramo de reciclagem e a expectativa de arrecadação da Fazenda Pública — o que obrigará a União a reformular sua programação orçamentária.
De acordo com o ministro, o STF deve evitar “mudanças súbitas em entendimentos consolidados nas esferas de governo, sobretudo quando essas guinadas puderem causar desequilíbrios orçamentários, tumultos sociais e, no limite, vácuos legislativos”.
O relator ainda constatou que os embargos da Ancat e da Abiplast pretendem a “reforma das conclusões alcançadas pelos membros da Corte”, já que todas as teses apresentadas nos recursos foram debatidas pelo Plenário.
Segundo o magistrado, os artigos 47 e 48 formam “um encadeamento lógico, caracterizado por intensa dependência recíproca”. Assim, a preservação apenas do artigo 48 romperia “com o equilíbrio interno da política tributária aprovada pelo Congresso”. Ou seja, invalidar somente o artigo 47 significaria a “criação de uma isenção tributária que não foi pretendida pelo legislador”.
Na visão de Gilmar, a norma não buscava conceder isenção aos fornecedores de insumos recicláveis, mas apenas adiar a incidência dos tributos para as etapas seguintes do processo industrial. Isso estava previsto na exposição de motivos do antigo Ministério da Economia à época da elaboração das regras.
O próprio artigo 48 diz que a incidência de PIS e Cofins “fica suspensa” na venda dos insumos recicláveis. “O legislador utiliza expressão que claramente denota uma desoneração circunstancial, vinculada a um evento futuro, qual seja, a majoração da tributação na etapa subsequente do processo de reciclagem”, explicou o ministro.
Por fim, o relator ressaltou que as entidades não pediram o retorno à sistemática anterior. Na verdade, tentaram “alcançar um resultado ainda melhor para o setor de reciclagem”. Segundo ele, isso deve ser buscado com o Congresso.
Divergência
Em 2021, Toffoli votou por invalidar o artigo 47 e manter o artigo 48, mas ficou vencido nesta última parte. No novo julgamento, reiterou seu entendimento e votou pela inconstitucionalidade apenas do artigo 47, mas sugeriu modulações.
No caso de sua tese ser aprovada, o ministro propôs que os efeitos da decisão passem a valer a partir da data da publicação da ata de julgamento dos embargos. Em caso de manutenção do acórdão de 2021, ele votou pela modulação a partir do exercício seguinte.
Segundo o magistrado, o artigo 48 prevê um benefício fiscal que desonera os “hipossuficientes envolvidos no início da cadeia de produção de insumos reciclados”.
Para Toffoli, “a tributação que incida diferencialmente sobre produtos e serviços conforme o impacto ambiental deles próprios ou de seus processos de elaboração e prestação para a defesa, preservação ou promoção do meio ambiente ecologicamente equilibrado” está de acordo com a Constituição.
Quanto à modulação, ele lembrou que o acórdão original abriu brecha para devoluções de tributos a empresas que, até então, estavam proibidas de usar créditos. De acordo com a Receita Federal, o impacto estimado é de R$ 9,35 bilhões.
A mesma decisão também permitiu que a União cobre PIS e Cofins, até mesmo de maneira retroativa, de quem vende materiais recicláveis. “Foi atingido por essa tributação o grupo mais fraco da cadeia econômica em questão, grupo esse formado principalmente por cooperativas de catadores e catadoras de materiais recicláveis e pequenos empreendimentos”, concluiu.
RE 607.109
José Higídio
é repórter da revista Consultor Jurídico.