O próprio texto constitucional exige de forma inequívoca o cumprimento da função social da propriedade produtiva como requisito simultâneo para não ser expropriada. Mesmo que tal interpretação seja rejeitada, deve-se, no mínimo, admitir que a Constituição abre uma pluralidade de sentidos. Assim, é legítima a opção do legislador por harmonizar as garantias constitucionais da propriedade produtiva com a funcionalização social exigida de todas as propriedades.
Com esse entendimento, o Plenário do Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade de regras da Lei da Reforma Agrária, de 1993, para desapropriação da propriedade privada que não cumprir sua função social — mesmo se for produtiva. A sessão virtual se encerrou na última sexta-feira (1º/9).
A Ação Direta de Inconstitucionalidade foi ajuizada em 2007 pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). A entidade argumentava que os requisitos de produtividade e função social não poderiam ser exigidos simultaneamente da propriedade rural.
Segundo a petição inicial, os trechos da lei embaralharam os conceitos de grau de utilização da terra e grau de eficiência em sua exploração. Para a CNA, a norma deu tratamento idêntico às propriedades produtivas e improdutivas e, com isso, contrariou a Constituição. A autora ainda argumentou que a exigência de produtividade invalida o requisito constitucional do “aproveitamento racional e adequado”
O voto do ministro Luiz Edson Fachin, relator do caso, foi acompanhado por unanimidade. De acordo com ele, “é impossível, tal como propõe a requerente, reconhecer a inexpropriabilidade da propriedade produtiva que não cumpra o requisito relativo ao aproveitamento racional e adequado”.
O parágrafo único do artigo 185 da Constituição diz que a lei fixará normas para cumprimento dos requisitos relativos à função social da propriedade produtiva. O magistrado apontou que tal dispositivo “exige o preenchimento simultâneo tanto do critério da produtividade quanto da função social”. Como os parâmetros mínimos da função social estão previstos expressamente no texto constitucional, “não há como afastar a exigência para as propriedades produtivas”.
Conforme o inciso II do mesmo artigo, a propriedade produtiva não pode ser desapropriada para fins de reforma agrária. Segundo Fachin, tal previsão é uma garantia de que o critério de produtividade será usado para o reconhecimento da função social. “Há, assim, uma imposição destinada ao legislador para que defina o sentido e alcance do conceito de produtividade, a fim de que esse critério seja considerado”, explicou.
O relator indicou que a propriedade é legitimada pelo seu uso socialmente adequado. Caso o proprietário rural descumpra suas obrigações, ocorre a desapropriação, com pagamento mediante dívida agrária, como forma de indenização pela perda do bem.
“Os proprietários são copartícipes na tarefa de concretizar os objetivos fundamentais da República”, assinalou Fachin. “Por isso, afigura-se necessário reconhecer que a exigência de cumprimento da função social é também aplicável à propriedade produtiva”.
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ADI 3.865
Fonte: CONJUR – 4/09/2023
“https://www.conjur.com.br/2023-set-04/stf-confirma-haver-desapropriacao-terras-produtivas”