E M E N T A. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL – TRIBUTÁRIO – PROCESSO CIVIL – POSSIBILIDADE DE EMENDA DA PETIÇÃO INICIAL – DESNECESSIDADE DA INTEGRAL GARANTIA DO JUÍZO, PARA O RECEBIMENTO DA DEFESA DO DEVEDOR – OMISSÃO DE RECEITAS – MOVIMENTAÇÃO EM CONTA BANCÁRIA – VIOLAÇÃO AO SIGILO INOCORRIDA – LICITUDE DA TRIBUTAÇÃO ANCORADA NO ART. 42, LEI 9.430/1996 – PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE DO ATO ESTATAL, RECAINDO SOBRE O CONTRIBUINTE O ÔNUS DE PROVAR – LIMITAÇÃO DA MULTA A 100% DO VALOR DO TRIBUTO DEVIDO – PARCIAL PROCEDÊNCIA AOS EMBARGOS – PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO FAZENDÁRIA E À REMESSA OFICIAL
1 – Restou aos autos plenamente provado que a parte embargante intentou acesso ao PA, anteriormente e dentro do prazo para a dedução dos embargos, ID 89987655 – Pág. 25 e seguintes, elemento essencial para formulação de defesa.
2 – Como mui bem sabe a Fazenda Nacional, os contribuintes, em geral, em vez de acessar os autos administrativos, seu exclusivo interesse e dever, comumente vem a Juízo alegar que o documento não foi trazido na execução, significando dizer que, tecnicamente, demonstrado foi justo motivo para que a parte executada postulasse por posterior emenda da inicial, a fim de obter subsídios para a formulação de defesa, sob pena de afronta ao contraditório e à ampla defesa, portanto não se há de falar em ilegalidade.
3 – Existe penhora no inventário, caindo por terra a tese fazendária de impossibilidade de mensuração do quinhão pertencente à embargante, a fim de se apurar a integralidade da garantia, pois esta não precisa ser integral, matéria apreciada na sistemática do art. 543-C, CPC/1973, REsp n. 1.127.815/SP, em 24/11/2010, Relator Ministro Luiz Fux.
4 – No que se refere à nulidade sentenciadora, esta não subsiste, pois a devolutividade recursal, envolvendo as teses formuladas recursalmente pela União, permite o exame da matéria alvo de irresignação.
5 – Cabe ao contribuinte desfazer a apuração fiscal, não o contrário. Precedente.
6 – Insta esclarecer-se decorre a transmissão dos dados de movimentação financeira, pelo Banco, de comando expresso da norma, o texto da Lei 9.311/96, de flagrante legitimidade, pois limpidamente a prevalecer o interesse público arrecadatório, sobre o particular.
7 – Se jungido se encontra o Estado ao Direito e se preconiza este, sem malferimento a comandos constitucionais (aliás, sim, em atendimento aos mesmos), podem (ou, até, devem, no âmbito também do Direito, que rege sua atuação funcional) as autoridades fiscais diligenciar diretamente à cata de elementos atinentes à vida financeiro-bancária das pessoas, com observância a todas as limitações e rigores que o tema encerra, inconteste não se esteja a constatar-se, na situação sob apreço, qualquer vício na postura administrativa preventivamente atacada, até o momento em que descrita e comprovada nos autos.
8 – Assegurado o sigilo a que se encontram obrigados os agentes fazendários, imposto, superiormente, pelo art. 198, CTN (mesmo sob a redação positivada pela LC 104/2001) e ausente qualquer comprovação de que tanto não foi respeitado, nenhuma mácula se nota, no agir fiscal nos autos hostilizado.
9 – Inadmitindo-se possam ser alçados mencionados direitos individuais ao plano de óbice à atuação estatal em tela – impulsionada, em última instância, pelos interesses públicos (sempre superiores, em situações como a sob exame, aos individuais ou particulares) – tanto quanto ausente qualquer evidência de descumprimento aos ditames atinentes ao sigilo e ao resguardo a que as informações e dados estão sujeitos, resulta do quanto conduzido à causa inexistir requisito basilar para se afastar a incidência das disposições contidas na LC 105/2001 e na Lei 10.174/2001 : inoponível, por conseguinte, o correntemente invocado art. 5º, inciso X, CF, por não contrariado e a se harmonizar com os valores constitucionais aqui antes gizados.
10 – Enfocados normativos têm o cunho procedimental/formal, portanto não ofendem a irretroatividade, a segurança jurídica nem o ato jurídico perfeito, de modo que a matéria já foi apreciada pelo C. Superior Tribunal de Justiça, sob o rito dos Recursos Repetitivos, art. 543-C, CPC/1973, ao norte da plena legalidade da atuação estatal em casos que tais, REsp 1134665/SP. Precedente.
11 – Registre-se, outrossim, que a Suprema Corte, por meio do RE 601.314, sob o prisma da Repercussão Geral, pacificou o tema: “O art. 6º da Lei Complementar 105/01 não ofende o direito ao sigilo bancário, pois realiza a igualdade em relação aos cidadãos, por meio do princípio da capacidade contributiva, bem como estabelece requisitos objetivos e o translado do dever de sigilo da esfera bancária para a fiscal”.
12 – Saliente-se, nesta quadra, que, conforme pela própria parte privada sustentado, embasada está a autuação em apuração de movimentação financeira em conta bancária, não se desvencilhando de seu o ônus de provar situação diversa o polo recorrido – provar a origem do recurso, demonstrar não seja verba tributável, por exemplo – como ao início destacado, art. 333, inciso I, CPC vigente ao tempo dos fatos.
13 – Tratando-se de conta conjunta, prevê o § 6º, do art. 42, Lei 9.430/1996, que, “na hipótese de contas de depósito ou de investimento mantidas em conjunto, cuja declaração de rendimentos ou de informações dos titulares tenham sido apresentadas em separado, e não havendo comprovação da origem dos recursos nos termos deste artigo, o valor dos rendimentos ou receitas será imputado a cada titular mediante divisão entre o total dos rendimentos ou receitas pela quantidade de titulares”.
14 – Partindo-se da própria tese embargante de que a Mauro competia provar a origem dos recursos, então, se falecido e prevendo a norma responsabilidade individual por cada quinhão, patente que a cotitularidade da conta bancária, por Sandra, a lhe impor ônus sobre o que lhe pertence, por isso não se há de falar em transferência da missão probatória ao espólio, nem em nulidade do lançamento, porque, aqui, executada Sandra, pessoa capaz e dotada de personalidade jurídica, o que atrai gozo de direitos e submissão a deveres.
15 – Logrou a Receita Federal, não com base somente nas palavras de Maria – mostrou-se surpresa com os fatos e negou conhecer a existência até mesmo da conta – mas com fulcro em elementos materiais, ID 89987682 – Pág. 132, que a genitora de Mauro era pessoa interposta, com base no seguinte estudo.
16 – Além disso, afirmou a Fiscalização: “fomos até a residência da contribuinte, Sra. Maria Rosa Vieira, para cientificá-la do “Termo de Início de Fiscalização”, e constatamos ser uma pessoa de avançada idade, sem condições físicas de locomover-se e apor sua assinatura em qualquer documento”.
17 – Com base nos fatos apurados, não logra a parte embargante provar participação de Maria Rosa Vieira nos fatos, porque materialmente apurou a Receita Federal que ela, na verdade, foi usada pelo filho Mauro, a fim de realizar as transações objeto de omissão de receitas.
18 – Em razão da demonstração de que aquela pessoa não fazia parte do ilícito tributário, correta a sua desconsideração, assim legítimo o rateio dos rendimentos entre os demais cotitulares e, falecido Mauro, responde Sandra pelos seus 50%.
19 – Sobre a específica responsabilidade da parte embargante, inoponível a arguição de ser Professora e “desconhecer” os fatos, porque Mauro era seu esposo e a conta bancária estava, também, em seu nome, assim desfrutou das benesses que as operações empresariais do marido lhe proporcionaram (proprietária de diversos imóveis, por exemplo, ID 89987603 – Pág. 28), portanto, para o bônus, há também a parcela de ônus, repousando suficiente a cotitularidade da conta, para responder pelo crédito tributário, porque a lei estabelece presunção e, repita-se, cabe ao contribuinte provar quadro diverso.
20 – Cai por terra o intento por se considerar os depósitos pré e pós-óbito, porque a norma em voga, art. 42, Lei 9.430/1996, trata da presunção de omissão de receitas e esta restou indelevelmente configurada, assim inoponível o argumento de que não poderiam ser utilizados depósitos bancários.
21 – Nesta senda, “a jurisprudência do STJ reconhece a legalidade do lançamento do imposto de renda com base no art. 42 da Lei 9.430/1996, tendo assentado que cabe ao contribuinte o ônus de comprovar a origem dos recursos a fim de ilidir a presunção de que se trata de renda omitida (AgRg no REsp 1.467.230/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 28.10.2014; AgRg no AREsp 81.279/MG, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 21.3.2012)”, AgRg no AREsp 664.675/RN, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 05/05/2015, DJe 21/05/2015.
22 – O tema restou definitivamente apaziguado por meio do RE 855649, apreciado sob o sistema de Repercussão Geral, firmando-se a tese de que “o artigo 42 da Lei 9.430/1996 é constitucional”.
23 – Diante dos elementos concretos de desajustes entre o que apurado em conta bancária e a incomprovação por parte do polo autor a respeito da origem dos recursos, frise-se que já principiando o próprio legislador por afirmar, no caput do art. 14, CTN, o tom subsidiário das regras de fiscalização ali estatuídas, naquele capítulo, em face de tantas outras especiais regendo este ou aquele assunto em específico, de seu parágrafo emana sua mais ampla abrangência, de modo a submeter ao ímpeto estatal fiscalizador toda e qualquer pessoa.
24 – O acesso aos elementos de convicção para o trabalho fiscal, de sua parte, tais com livros, mercadorias, arquivos e documentos em geral, da mesma forma, vem dilargado nos termos do caput do art. 195, CTN, afastando este ditame regramentos normativos excludentes ou limitadores do alcance a referidas fontes probatórias.
25 – Desfruta a Administração, pois, de ampla liberdade investigatória, na vasculha de elementos de convicção, na apuração dos fatos, restando legítimo o agir da Receita Federal, sem qualquer demonstração do autuado a respeito da origem/licitude dos recursos apurados.
26 – Já conhece a parte embargante o destino da presente ação, porque esta C. Quarta Turma já apreciou outro processo que tratou do mesmo assunto, autos 0000592-35.2014.4.03.6143, portanto a responsabilidade pelo débito é mais do que legítima. Precedente.
27 – O valor total de depósitos (a somatória), no ano 2000, foi de R$ 70.011,94, ID 89987655 – Pág. 84, assim não se aplica a disposição do art. 42, § 3º, inciso II, Lei 9.430/1996.
28 – O Excelso Pretório chancela a validade de multas punitivas de até 100% do valor do tributo devido, o que restou desrespeitado no caso concreto, ID 89987655 – Pág. 80. Assim, cabível a redução da multa. Precedente.
29 – A título sucumbencial, em prol da União, o encargo do Decreto-Lei 1.025/1969, por ter decaído a Fazenda Pública de mínima porção.
30 – Ausentes honorários recursais, por sentenciado o processo sob a égide do CPC anterior, EDcl no AgInt no REsp 1573573/RJ, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 04/04/2017, DJe 08/05/2017.
31 – Parcial provimento à apelação e à remessa oficial, reformada a r. sentença, para julgamento de parcial procedência aos embargos, unicamente para limitar a multa punitiva a 100%, tudo na forma retro estabelecida.
(TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv – APELAÇÃO CÍVEL – 0018228-48.2013.4.03.6143, Rel. Desembargador Federal JOSE FRANCISCO DA SILVA NETO, julgado em 02/06/2023, DJEN DATA: 07/06/2023)