Publicada no Diário Eletrônico em 17/01/2023
Ementa.
ICMS – Reestruturação de empresa – Cisão parcial de estabelecimento – Saída de bem do ativo imobilizado – Empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico – Emissão de Nota Fiscal.
I. Considera-se transferência a operação de que decorra a saída de mercadoria ou bem de um estabelecimento com destino a outro pertencente ao mesmo titular (artigo 4º do RICMS/2000).
II. O direito de se creditar nos termos do § 11 do artigo 61 do RICMS/2000 é específico e restrito para as operações de transferência, assim considerada aquela entre estabelecimentos do mesmo contribuinte – mesma titularidade.
III. Não pode ser considerado como transferência a saída de bem do ativo imobilizado com destino a empresa diversa da remetente, ainda que pertencente ao mesmo grupo econômico.
IV. A saída de bem do ativo imobilizado é hipótese de não incidência de imposto, e por consequência, não confere direito a crédito para o adquirente (artigo 7º, inciso XIV, e artigo 61 do RICMS/2000).
V. É permitida a transferência de crédito simples do imposto, decorrente da entrada de bem destinado à integração no ativo permanente, para estabelecimento de empresa interdependente, nos termos de disciplina estabelecida pela Secretaria da Fazenda e Planejamento (artigos 70, inciso III, e 71, inciso II, do RICMS/2000).
Relato
1. A Consulente, cuja atividade econômica principal registrada no Cadastro de Contribuintes do Estado de São Paulo – CADESP é a “fabricação de artefatos de material plástico para outros usos não especificados anteriormente” (CNAE 22.29-3/99), relata que está em um processo de cisão no qual foi aberto um novo CNPJ.
2. Assevera que em relação ao ativo imobilizado ainda restam parcelas do crédito do imposto para se apropriar e questiona:
2.1. como deve proceder nessa situação em relação ao saldo de créditos;
2.2. se for feito via apuração, qual o código que deve ser informado na GIA;
2.3. se deve emitir Nota Fiscal para transferência destes créditos;
2.4. caso a resposta ao item 2.3 seja afirmativa, como deve ser feita a emissão da Nota Fiscal, de “ativo por ativo com o CIAP” ou de uma Nota Fiscal com o valor total.
Interpretação
3. Preliminarmente, diante das poucas informações fáticas, depreende-se do relato que a Consulente promoveu uma cisão parcial de estabelecimento, na qual novo estabelecimento foi constituído com CNPJ distinto e que uma parcela de seus ativos será vertida ao novo estabelecimento.
4. Ainda em sede preliminar, observa-se que a Consulente não forneceu informações importantes para o entendimento da dúvida trazida, em especial os dados referentes ao estabelecimento destinatário do bem do ativo imobilizado. Nesse ponto, ressalta-se que tais informações são relevantes para uma resposta conclusiva, visto que a legislação prevê tratamento tributário diverso em relação à saída de bem do ativo imobilizado para estabelecimento de mesma titularidade e para estabelecimento de titularidade diversa, mesmo que pertencente ao mesmo grupo econômico.
5. Assim, essa resposta adotará como premissa que a operação será realizada por empresas pertencentes ao mesmo grupo econômico, contudo, de titularidade diversa (ou seja, não pertencente ao mesmo CNPJ base). Caso essa premissa não se confirme, a Consulente poderá retornar com nova consulta trazendo todas as informações necessárias para o conhecimento integral da situação.
6. Dito isso, cabe destacar que a situação em estudo (cisão parcial de estabelecimento) não se trata de transferência integral do estabelecimento nos termos do artigo 3°, inciso VI, da Lei Complementar 87/1996, de modo que lhe devem ser aplicadas as consequências jurídico-tributárias que lhes são próprias.
7. Nesse diapasão, convém esclarecer que, em regra, os negócios jurídicos que envolvem transformação na natureza e na forma de sociedades não estão diretamente afetos às questões tributárias pertinentes ao ICMS, pois cuidam de questões civis, ligadas ao patrimônio social e não à circulação de mercadorias. Isso não significa, contudo, que em todas as situações em que o patrimônio, integral ou parcialmente, passa de uma para outra empresa, nova ou preexistente, não haja situação que configure hipótese de incidência do imposto estadual sobre circulação de mercadorias.
8. Desse modo, apesar de a reorganização societária (por incorporação, fusão ou cisão), assim como a alteração de titularidade, serem situações fora do alcance da incidência do ICMS, o mesmo não pode, necessariamente, ser dito dos bens e mercadorias envolvidos nessas transações negociais que, conforme o caso, podem ou não ser alcançados pela incidência do tributo estadual.
9. Assim, destaca-se que, para a legislação do ICMS, o que importa não é se a empresa sofreu uma reorganização (cisão, fusão, etc.), total ou parcial, mas sim se o estabelecimento, como unidade autônoma que é, foi transferido na sua integralidade ou apenas sofreu o destaque de determinada parcela. Ou seja, o que importa para a definição da disciplina jurídica-tributária aplicável é o que acontece de fato com o estabelecimento enquanto unidade autônoma.
10. No caso relatado, há uma operação de cisão do próprio estabelecimento, na qual parte dos ativos do estabelecimento da Consulente será vertido em favor de terceira empresa (nova empresa), ainda que do mesmo grupo econômico. Em outras palavras, ocorre a saída de bens do ativo que são apartados (saídos, retirados) do estabelecimento original para ingressarem (serem admitidos) em outro estabelecimento (da nova empresa).
11. Dessa forma, destaca-se que a não incidência do ICMS abrange apenas as operações de qualquer natureza de que decorra a transferência integral do estabelecimento, conforme artigo 3°, inciso VI, da Lei Complementar 87/1996, o que não ocorre no caso em tela.
12. Portanto, na medida em que a operação de transferência não ocorre conforme o disposto no artigo 3º, inciso VI, da Lei Complementar 87/1996, ou seja, o estabelecimento não é transferido em sua integralidade, não há possibilidade de se transferir o saldo credor de ICMS para o estabelecimento cindendo.
13. Salienta-se, por outro lado, que a saída dos bens do ativo imobilizado (seja para estabelecimento de mesma titularidade, ou para de titularidade diversa), contam com a não incidência do imposto, nos termos do artigo 7º, inciso XIV, do RICMS/2000. Nesse ponto, observa-se que, por regra, o contribuinte que proceder saída não tributada, deve estornar eventual crédito tomado quando de sua entrada (artigo 67, inciso II, do RICMS/2000).
13.1. As saídas dos bens do ativo imobilizado deverão ser objeto de emissão de Notas Fiscais, nas quais se consignará tratar-se de operações não sujeitas à incidência do ICMS (artigo 7º, inciso XIV, do RICMS/2000), cabendo à Consulente, ainda, observar as regras de vedação e estorno de crédito (artigos 66 e 67 do RICMS/2000).
14. Ademais, por se tratar de saída não tributada, a saída de bem do ativo imobilizado, por consequência, não confere direito a crédito para o adquirente, tendo em vista o disposto no caput do artigo 61 do RICMS/2000 (“Para a compensação, será assegurado ao contribuinte, salvo disposição em contrário, o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado, nos termos do item 2 do § 1º do artigo 59, relativamente a mercadoria entrada, real ou simbolicamente, em seu estabelecimento, ou a serviço a ele prestado, em razão de operações ou prestações regulares e tributadas”).
15. Não obstante, especificamente quanto à hipótese de transferência de bem do ativo imobilizado, a legislação paulista, nos termos do § 11 do artigo 61 do RICMS/2000, permite o direito de crédito das parcelas remanescentes do ativo imobilizado. Cabe ressaltar, todavia, que esta previsão é específica e restrita para as operações de transferência, assim considerada aquela entre estabelecimentos do mesmo contribuinte – mesma titularidade (mesmo CNPJ base), uma vez que, nos termos do inciso V do artigo 4º do RICMS/2000, assim é definida: “transferência é a operação de que decorra a saída de mercadoria ou bem de um estabelecimento com destino a outro pertencente ao mesmo titular”.
16. Contudo, em se tratando de estabelecimentos interdependentes (inciso II e § 1º do artigo 73 do RICMS/2000), caso haja saldo credor decorrente de ativo imobilizado, atendidos os requisitos legais, esse poderá ser transferido ao estabelecimento destinatário, nos termos do inciso III do artigo 70 do RICMS/2000, na redação dada pelo Decreto 56.133/2010, mediante prévia autorização da Secretaria da Fazenda e Planejamento, conforme item “1” de seu §1º.
16.1. O pedido deverá observar também (além dos requisitos e condições constantes dos artigos 70 e 73 supracitados) os ditames da Portaria CAT 14/2012. Recomenda-se que, ainda que o pedido preceda à saída do bem do estabelecimento.
17. Vale ressaltar, por fim, que os simples registros em contas patrimoniais, mesmo que embasados por contratos escritos de qualquer natureza, não têm o condão de transmitir direitos ou obrigações tributárias, pois estes devem ser apurados por meio de escrituração fiscal, na forma prevista pelos artigos 213 e seguintes do RICMS/2000.
18. Com esses esclarecimentos, consideram-se dirimidas as dúvidas da Consulente.
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.