Publicada no Diário Eletrônico em 19/10/2022
Ementa
ICMS – Crédito – Aquisição de gado em pé de outro Estado – Valor real da operação.
I. Na aquisição interestadual de gado bovino, em que o Estado de origem tenha fixado pauta fiscal superior à estabelecida em lei complementar ou em acordo firmado entre os Estados, o contribuinte paulista apenas pode se apropriar do crédito correspondente até o valor fixado em pauta paulista e/ou o montante do preço corrente de mercado (Comunicado CAT-74/1994).
II. Caso o contribuinte comprove, através de documentos comerciais hábeis, o valor pago na aquisição dos bovinos, o direito ao crédito do imposto relativo à referida entrada deverá ser calculado sobre o valor da operação.
III. Caso tenha sido destacado, em documento fiscal, valor superior ao efetivamente cobrado pelo Estado de origem, o excesso não poderá ser apropriado como crédito pelo estabelecimento paulista adquirente (artigo 61, § 5º do RICMS/2000).
IV. O contribuinte pode se apropriar dos créditos de forma extemporânea, decorrentes das operações alcançadas por benefício tributário reinstituído nos termos do Convênio ICMS 190/2017 e da Lei Complementar Federal nº 160/2017, desde que realizadas a partir da data em que foi formalizada sua reinstituição nos termos regulamentados pelo CONFAZ.
Relato
1. A Consulente, produtora rural, que tem como atividade principal registrada no Cadastro de Contribuinte de ICMS do Estado de São Paulo (CADESP) a “criação de bovinos para corte” (código 01.51-2/01 da Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE), relata que adquire gado em pé para criação junto de fornecedores estabelecidos em outras unidades da Federação e que também realiza aquisição interna e interestadual de alguns insumos utilizados no processo de criação.
2. Faz menção a diversos dispositivos normativos, dentre eles o Comunicado CAT-74/1994, o qual trata das operações interestaduais cujo imposto foi recolhido por pauta fiscal em outro Estado, o artigo 155 da Constituição Federal, o artigo 19 da Lei Complementar nº 87/1996 e o artigo 59 do Regulamento do ICMS paulista (RICMS/2000), os quais tratam, em suma, do princípio da não cumulatividade e do direito de se creditar do imposto anteriormente cobrado.
3. Informa que, para determinação do crédito do ICMS a ser aproveitado, faz um comparativo entre os valores definidos em pauta paulista, pauta do Estado de origem da mercadoria e aqueles eventualmente recolhidos por GNRE (Guia Nacional de Recolhimento de Tributos Estaduais), ressaltando que se apropria do menor deles.
4. Cita trechos da Resposta à Consulta Tributária nº 5166/2015, publicada por este órgão consultivo, entendendo versar sobre o mesmo assunto aqui em discussão, e , ao final, questiona se poderá se apropriar do crédito relativo ao valor integral do imposto recolhido pelo fornecedor na GNRE, desde que comprovado o recolhimento do imposto na saída da mercadoria, tendo como base o valor real da operação.
5. Indaga, ainda, se é permitido se aproveitar do crédito de forma extemporânea, relativamente aos fatos pretéritos ocorridos e comprovados mediante Nota Fiscal, Guia de Recolhimento de ICMS e comprovante do pagamento.
Interpretação
6. Inicialmente, destacamos que a utilização do crédito de ICMS por produtor rural deve ser realizada, a partir de 1º de janeiro de 2012, nos termos da Portaria CAT-153/2011, que instituiu o Sistema Gerenciador de Crédito de Produtor Rural e de Cooperativa de Produtores Rurais – Sistema e-CredRural.
7. Em relação à pauta fiscal, o artigo 46 do RICMS/2000 dispõe que a Secretaria da Fazenda e Planejamento pode estabelecer um valor mínimo para determinadas operações ou prestações. Entretanto, conforme § 3º desse mesmo artigo, a aplicação de pauta fiscal em operações ou prestações interestaduais depende de celebração de acordo entre os Estados envolvidos.
8. Convém esclarecer que o direito ao crédito do imposto relativo à entrada de mercadoria no estabelecimento de contribuinte paulista, remetida por contribuinte situado em outro Estado, é limitado à importância correspondente à aplicação da alíquota de 12% sobre o valor da operação. Entretanto, conforme o Comunicado CAT-74/1994, em relação às operações com mercadorias advindas de outros Estados, em que o imposto tenha sido cobrado com base em pauta fiscal daquele Estado (esta não objeto de acordo), o contribuinte paulista apenas pode se apropriar do crédito correspondente até o valor fixado em pauta paulista (Portaria CAT-25/2020) e/ou o montante do preço corrente de mercado.
9. Porém, conforme mencionado na Resposta à Consulta nº 5166/2015, citada pela própria Consulente, o valor da pauta fiscal é uma presunção relativa, podendo o contribuinte se valer do valor real da operação, desde que comprove por todos os meios de prova admitidos, que o efetivo valor da operação é o declarado nos respectivos documentos.
10. Caso o Estado de origem tenha fixado base de cálculo superior à estabelecida em lei complementar ou em acordo firmado entre os Estados, o excesso não poderá ser apropriado como crédito pelo estabelecimento paulista adquirente, conforme disposto no artigo 61, §§ 5º e 6º, do RICMS/2000.
11. É de se notar que o artigo 61 do RICMS/2000, em seucaput, assegura ao contribuinte o direito de creditar-se do “imposto anteriormente cobrado”, estabelecendo também, pela redação de seu § 5º, que “se o imposto for destacado a maior do que o devido no documento fiscal, o excesso não será apropriado como crédito”.
12. Assim, caso o ICMS da operação de venda do gado em pé seja cobrado em valor inferior ao destacado no respectivo documento fiscal, por força de previsão de aplicação de benefício concedido unilateralmente pelo Estado de origem (crédito outorgado, por exemplo), a Consulente só terá direito a se creditar do valor do imposto efetivamente cobrado no Estado de origem.
13. Dessa forma, o fato de o fornecedor da Consulente ter efetuado o recolhimento do imposto em GNRE relativo ao valor real da operação, não garante à Consulente o direito de se aproveitar do crédito relativo a este valor integral. A Consulente somente poderá se apropriar do crédito do imposto correspondente à entrada de gado em pé em seu estabelecimento localizado em território paulista, remetido por estabelecimento localizado em outra unidade federada, relativo ao valor real da operação (acima da pauta paulista), se comprovar por todos os meios de prova admitidos, que o efetivo valor da operação é o declarado nos respectivos documentos e que o imposto destacado em documento fiscal hábil foi efetivamente cobrado pelo Estado de origem.
14. Por sua vez, nas ocasiões em que o valor pago na aquisição da mercadoria advinda de outro Estado for igual ou inferior àquele constante da pauta paulista, o direito ao crédito do imposto relativo à referida entrada da mercadoria deverá ser calculado integralmente sobre o valor da operação. Isso é, prevalece o valor efetivamente cobrado.
15. Quanto à dúvida acerca da possibilidade de aproveitamento de créditos de forma extemporânea, relativamente a operações pretéritas, esclarecemos que o crédito, quando admitido, poderá ser lançado, inclusive na forma extemporânea, por seu valor nominal, conforme preceitua o artigo 61, § 2º, do RICMS/2000, observado o prazo de prescrição quinquenal, conforme preceitua o artigo 61, § 3º e nos termos do artigo 65, todos do RICMS/2000. No entanto, na presente situação, deve ser utilizada a sistemática prevista na Portaria CAT-153/2011 para a escrituração do crédito no e-CredRural, tendo em vista tratar-se de contribuinte produtor rural.
16. Em relação à questão do aproveitamento dos créditos decorrentes de operações beneficiadas por isenções, incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais, relativos ao ICMS, concedidos em desacordo com o disposto na alínea “g” do inciso XII do § 2º do artigo 155 da Constituição Federal, faz-se necessário observar o disposto no Convênio ICMS 190/2017, fundamentado na Lei Complementar nº 160/2017, que trata da reinstituição de benefícios fiscais.
16.1. Nesse contexto, a cláusula décima quinta do referido Convênio, ao tratar da temática relativa à apropriação de créditos, determina que a remissão ou a não constituição de créditos tributários concedidas por lei da unidade federada de origem da mercadoria, do bem ou do serviço, nos termos ali tratados, afastam as sanções previstas no artigo 8º da Lei Complementar nº 24/1975, retroativamente à data original de concessão dos benefícios fiscais de que trata a cláusula primeira do mesmo Convênio, vedadas a restituição e a compensação de tributo e a apropriação de crédito extemporâneo por sujeito passivo.
17. Como é possível observar do exposto no subitem 16.1, é vedado ao sujeito passivo, na situação em análise, apropriar-se do crédito extemporâneo, aqui compreendido como o crédito do ICMS relativo às operações que ocorreram antes da data em que o benefício foi reinstituído.
18. Ou seja, o contribuinte pode se apropriar dos créditos de forma extemporânea, decorrentes das operações alcançadas por benefício tributário reinstituído nos termos do Convênio ICMS 190/2017 e da Lei Complementar Federal nº 160/2017, desde que realizadas a partir da data em que foi formalizada sua reinstituição nos termos regulamentados pelo CONFAZ. Isso porque, a partir do momento em que o benefício foi reinstituído, nos termos da legislação citada, tornou-se um benefício fiscal regular.
19. Por fim, quanto à análise dos documentos probatórios do valor das operações efetuadas, esclarecemos que a esta Consultoria Tributária compete tão somente a interpretação da legislação tributária. Conforme o artigo 40 da Portaria CAT-153/2011, compete ao Delegado Regional Tributário, em face de caso concreto, a análise documental, apreciação e decisão sobre os pedidos de aproveitamento de crédito do ICMS de produtores rurais e cooperativas de produtores rurais.
A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.