Uma contribuinte conseguiu na Justiça o direito de voltar a parcelamento negociado em transação tributária com a Fazenda Nacional. Ela foi excluída por ficar devendo uma única parcela. O Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região, com sede em São Paulo, entendeu que a medida não traria prejuízo ao Fisco.
As dívidas negociadas pela contribuinte são referentes a Imposto de Renda (IRPF). Ela aderiu à transação excepcional regulamentada pela Portaria PGFN nº 14.402, de 2020. Comprometeu-se a pagar o que deve em 145 prestações – 12 delas de entrada, no valor de R$ 1.335,24 por mês, e mais 133 parcelas, de R$ 1.050,90.
Por um problema de saúde, deixou de quitar a última parcela da entrada, que venceu em julho de 2021. Pelas regras do programa, o contribuinte pode ser excluído se não pagar a entrada, perdendo as condições negociadas.
Tão logo melhorou, tentou quitá-la por meio do programa “Regularize da PGFN”, mas foi surpreendida, segundo afirma no processo, com o apontamento de que a transação havia sido cancelada, sem qualquer notificação prévia.
Em setembro, apresentou requerimento à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) de reconsideração do cancelamento da transação. Mas não obteve resposta. Recorreu, então, ao Judiciário.
Em primeira instância, porém, o pedido da contribuinte foi negado. O juiz levou em consideração que a adesão à transação só ocorreria com o pagamento de todas as parcelas da entrada.
A contribuinte recorreu ao TRF da 3ª Região. Alegou que o próprio Ministério da Fazenda atestou, por meio de comprovante, que a adesão à transação tributária já havia sido consolidada.
No caso, com a exclusão, perderia o desconto de aproximadamente 65% do valor negociado com a Fazenda Nacional. A dívida, com o abatimento, caiu de cerca de R$ 400 mil para aproximadamente R$ 150 mil.
Para o advogado Jonas Serapião Ferreira, do escritório Brigagão, Duque Estrada, que atua no caso, o cancelamento automático da transação, sem qualquer notificação e sem que o contribuinte possa pagar uma única parcela em atraso, seria irrazoável. “É do interesse da Fazenda Nacional e dos contribuintes que os débitos possam ser quitados”, afirma.
Apesar de a ação ter sido movida por pessoa física, o entendimento pode favorecer também pessoas jurídicas, segundo o advogado. Desde 2020, os contribuintes podem aderir à transação tributária para pagar débitos inscritos na dívida ativa da União. Foram fechados, até agora, 981 mil acordos, para a regularização de R$ 232,7 bilhões.
A decisão liminar foi concedida pelo desembargador Nelton Agnaldo Moraes dos Santos. De acordo com ele, fica clara na Portaria PGFN nº 14.402, de 2020, a possibilidade de exclusão de contribuinte que deixar de efetuar o pagamento de todas as parcelas relativas ao “pedágio” (entrada). Porém, acrescenta, “não se extrai qualquer dispositivo expresso que vede o pagamento de parcelas em atraso, caso seja este o motivo da rescisão”.
Para o desembargador, “a negativa de reinclusão no parcelamento vai de encontro aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, sobretudo quando evidenciada a ausência de prejuízo ao Fisco” (processo nº 5031851-15.2021.4.03.0000).
Ainda de acordo com o desembargador, a exclusão da devedora do parcelamento é capaz de produzir quadro de difícil reparação, “em razão das consequências advindas do restabelecimento da exigibilidade do débito”. Por outro lado, acrescenta, a permanência do contribuinte no parcelamento até a decisão final “não importa, por ora, qualquer gravame à Fazenda Pública”.
No caso, a contribuinte vai depositar os valores das parcelas em conta judicial, segundo o advogado Jonas Serapião Ferreira, até a transação ser regularizada e os pagamentos poderem ser feitos por meio do sistema da PGFN.
Em nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional afirma que o caso não trata de rescisão da transação, mas sobre cancelamento da conta destinada a recepcionar a entrada exigida por lei para confirmar a adesão do contribuinte, e sem a qual a adesão à transação sequer é aperfeiçoada.
“Não há que se falar em rescisão, mas em não adesão. Essa compreensão, cristalina na legislação de regência e fundamental para garantir a transparência e controle de fluxos nos milhares de pedidos de transação realizados diariamente, continuará sendo defendida em juízo pela Fazenda Nacional”, diz a PGFN.
Fonte: Valor Econômico