Espera-se que a interpretação que será dada pelo STF confira o adequado ressarcimento às empresas que se enquadram nos critérios de aproveitamento do Reintegra.
As ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs) 6040 e 6055 versam sobre o Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras (Reintegra) e, dentre outras alegações, suscitam a parcial inconstitucionalidade do artigo 22 da Lei Federal nº 13.043/2014 e, por arrastamento, do artigo 2º do Decreto nº 8.415/2015.
Tais dispositivos disciplinam o procedimento de devolução dos resíduos tributários que remanescem na cadeia de produção de bens exportados, como forma de corrigir as distorções geradas pelo sistema tributário brasileiro e, assim, impedir a exportação de tributos por meio do Reintegra. O referido artigo 22 estabelece que a empresa que exporte bens do rol taxativo do artigo 23 da mesma lei poderá apurar crédito mediante a aplicação de percentual estabelecido pelo Poder Executivo, tal percentual pode variar entre 0,1% e 3%.
Na hipótese de resíduos tributários adicionais não cobertos pelo regime, a Lei nº 13.043/2014, no parágrafo 2º do citado artigo 22, estabelece que tal crédito poderá, ainda, excepcionalmente: “(…) ser acrescido em até 2 (dois) pontos percentuais, em caso de exportação de bens em cuja cadeia de produção se verifique a ocorrência de resíduo tributário que justifique a devolução adicional (…)”, desde que “comprovado por estudo ou levantamento realizado conforme critérios e parâmetros definidos em regulamento”.
Não obstante, apesar de ter mais de sete anos de vigência no ordenamento brasileiro, o instituto do Reintegra nunca teve seu residual de 2% devidamente regulamentado, o qual deveria ser apurado com a aplicação de percentual de representatividade das receitas de exportação frente ao total das receitas do contribuinte de bens industrializados, de modo que deveria ser garantido quando a soma da proporção dos tributos recolhidos sobre a exportação (considerando encargos sociais, Cides, ISS, dentre outros) é superior ao montante restituído no cálculo comum do Reintegra.
Espera-se que a interpretação que será dada pelo STF confira o adequado ressarcimento às empresas
No último dia antes do recesso do Judiciário, foi divulgado que as referidas ADIs foram incluídas na pauta para julgamento no dia 17 de março.
Movida pelo Instituto Aço Brasil, a ADI 6040 suscita a necessidade de declaração parcial de inconstitucionalidade em relação à expressão “estabelecido pelo Poder Executivo” no artigo 22 e parágrafos da Lei nº 13.043/2014, uma vez que a autonomia conferida ao Poder Executivo, de editar o regulamento para determinar as condições para o aproveitamento do residual de Reintegra, permite brechas à modificação do percentual dos resíduos pelo Poder Executivo de maneira arbitrária, lesando o preceito constitucional de desenvolvimento nacional.
Além disso, requer seja dada interpretação conforme a Constituição aos parágrafos 1º e 2º, que atualmente regulam a variação de percentual por diferenciação de bem exportado para “assegurar o direito do exportador de recuperar o resíduo tributário que indevidamente remanesce na cadeia produtiva do produto exportado, mediante a comprovação por estudo ou levantamento em cada caso concreto, submetido ao crivo da autoridade administrativa”.
Por último, impugna a constitucionalidade do Decreto nº 8.415/2015, para que seja suprimida a expressão “de 3%” (constante do caput do artigo 2º) e para que sejam declarados inconstitucionais os parágrafos 7º e 8º do mesmo artigo, que tratam das variações dos percentuais em determinados períodos, de forma a assegurar a utilização plena do Reintegra, isto é, a aplicação de percentual que garanta, em cada cadeia produtiva de produto exportado, a devolução integral dos resíduos tributários verificados.
Já a ADI 6055 foi proposta pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) e guarda similaridades com a ADI 6040, tendo por um dos objetos a declaração parcial de inconstitucionalidade do mesmo dispositivo 22 da Lei nº 13.043/2014.
O pleito também abrange pedido de inconstitucionalidade por arrastamento dos Decretos nº 8.543/2015, nº 9.148/2017 e nº 9.393/2018, a fim de ter como efeito, um controle da discricionariedade do Poder Executivo para modificar os percentuais do Reintegra.
Como consequência, requer que a Corte fixe interpretação ao artigo 22 da Lei nº 13.043/14, vedando o Poder Executivo de reduzir discricionariamente os percentuais de apuração do crédito do Reintegra. Isso porque, apesar de o Executivo ter por função calibrar o percentual de apuração de valores residuais, “após fixar o percentual que entender adequado, não o pode reduzir discricionariamente e sem uma relevante justificativa”.
Assim, a expectativa do julgamento dá-se pela análise que será realizada quanto à prerrogativa do Poder Executivo para modificar indiscriminadamente os percentuais do instituto e sanar a questão. Se positiva ao contribuinte, espera-se que a interpretação que será dada confira o adequado ressarcimento às empresas que se enquadram nos critérios de aproveitamento do Reintegra, conforme previsão legal, cessando a ampla discricionariedade que o Poder Executivo vem apresentando ao promulgar sucessivos decretos reduzindo imotivadamente os percentuais do regime – deixando de fazê-lo, por outro lado, em relação ao residual de 2% -, prejudicando a sua função e, consequentemente, o desenvolvimento econômico do país.
Independentemente da política governamental, o direito dos contribuintes está fundamentado em normas constitucionais que garantem ao exportador o aproveitamento dos créditos do Reintegra, a fim de evitar a consequente exportação de tributos.
Por Bárbara Bach, advogada sênior em direito tributário contencioso da Lira Advogados
Valor Econômico – Por Bárbara Bach, 02/03/2022