No último mês de dezembro, foi sancionada no estado de São Paulo uma lei que retomou a isenção do imposto sobre propriedades de veículos automotores (IPVA) para pessoas com deficiência (PCD), independentemente de o automóvel possuir adaptações. Mesmo assim, o texto ainda não foi regulamentado e, por isso, a maioria das pessoas vem recebendo a cobrança do valor integral do tributo. Dessa forma, acionar a Justiça passa a ser a opção mais viável para se tentar uma resolução rápida à questão.
Em janeiro do último ano entrou em vigor a Lei Estadual 17.293/2020. A norma limitava a isenção do IPVA apenas a veículos adaptados e pessoas com deficiência severa ou profunda. A mudança de regra gerou uma enxurrada de ações judiciais, que tiveram decisões com diferentes entendimentos.
A Lei 17.473/2021 chegou para reverter a situação. O texto revogou a necessidade de veículo adaptado e ampliou o escopo da isenção a pessoas com deficiência moderada, grave ou gravíssima e com autismo. No entanto, a lei ainda não foi regulamentada e, portanto, ainda não está valendo integralmente. “Estamos ainda sob a égide da lei antiga”, explica o advogado Cláudio Amorim Jr.
No final de 2020, Amorim Jr., especialista em processo civil, foi contatado por muitas pessoas que buscavam acionar a Justiça contra a limitação da isenção. Ele resolveu fazer uma representação e entregá-la ao Ministério Público paulista. A provocação de Cláudio, o recebimento de novas representações de outras pessoas e a falta de manifestação da Secretaria de Fazenda e Planejamento do governo estadual levaram o MP-SP a ajuizar ação civil pública, em janeiro de 2021, para questionar a mudança de regra.
Um ano depois, o governo de São Paulo resolveu consertar a medida controversa — mas a mudança por enquanto está apenas no papel. A Fazenda estadual ainda não tem um “manual de instrução” para a aplicação da nova lei, nem mesmo uma previsão de quando essa regulamentação deve acontecer.
Demora prejudicial
“Eu não vejo motivos claros e plausíveis para não regulamentar uma lei que já foi inclusive publicada no Diário Oficial”, diz Cláudio. “É um descaso muito grande com a população PCD. O governo dá uma coisa, mas na verdade não dá. De que vale a lei não regulamentada?”, afirma o especialista.
O IPVA já é cobrado desde o dia 1/1. O prazo de pagamento do tributo, com desconto de 9%, para quem tem veículos com placa terminada em “1” encerrou-se última segunda-feira (10/1). Há a opção de pagar em fevereiro, mas com apenas 5% de desconto. Para Cláudio, ainda há a esperança de que, até lá, a lei seja regulamentada.
A Fazenda recentemente disponibilizou em seu site uma “pista” de como funcionará a isenção. Na aba de “perguntas frequentes”, a secretaria aponta que seguirá as regras válidas para o ICMS de veículos de pessoas com deficiência: isenção total para valor venal de até R$ 70 mil; e cobrança de IPVA proporcional para veículos que ultrapassem esse valor, com limite de R$ 100 mil. A advogada Nicole Sanches afirma que inclusive há ações pleiteando isenção para veículos que custam mais que esse teto.
A explicação, porém, não é suficiente para aplicação da lei e não substitui a regulamentação oficial. Segundo Cláudio, é possível que haja surpresas: “A lei dá a impressão de que todas as pessoas que eram isentas em 2020 vão continuar isentas. Mas e se a regulamentação vier dizendo alguma coisa contrária do que consta no texto da lei?”.
O que fazer?
A saída, segundo o advogado, é esperar a regulamentação. Até lá, o melhor caminho é não pagar o IPVA e ajuizar ação — declaratória de inexigibilidade de débito fiscal ou mandado de segurança — com pedido liminar para aplicação imediata da lei, de preferência antes de fevereiro.
Apesar dos riscos, Amorim Jr. indica que um eventual estorno de valores pagos seria difícil de acontecer, e, de qualquer forma, exigiria judicialização. “As pessoas têm que correr atrás para que a lei seja aplicada”, ressalta.
Contribuintes que tentaram contato com a Secretaria da Fazenda e Planejamento paulista têm afirmado que a pasta, ao responder a questionamentos, informou que “a isenção de IPVA será concedida desde que atendidas as exigências contidas na legislação vigente”. E reconheceu que, como ainda não houve a regulamentação das alterações na concessão da isenção para PCD trazidas pela Lei 17.473/2021, “o interessado deve aguardar essa regulamentação e posteriormente efetuar pedido de isenção de acordo com os novos procedimentos a serem definidos”. E que, “se atendidos os novos requisitos e aprovada a concessão da isenção, ela terá efeitos retroativos para 2022”.
Ainda segundo a resposta da Secretaria, a recomendação a quem teve o IPVA cobrado é pagá-lo e, após a regulamentação, fazer o pedido de isenção — que, se deferido, gerarará a restituição dos valores. Outra opção seria não pagar o imposto, mas com o risco de, caso haja indeferimento administrativo do pedido de isenção, incidência de juros de mora e multa.
Aos que não tenham condições de contratar um advogado, Cláudio Amorim Jr. recomenda que procurem o MP, por meio do endereço de e-mail deficiente@mpsp.mp.br, ou o próprio promotor que está cuidando da ação civil pública. É possível também ingressar na Justiça sem assistência de um advogado, perante Vara do Juizado Especial Cível da Fazenda Pública.
Por José Higídio
José Higídio é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 13 de janeiro de 2022.
https://www.conjur.com.br/2022-jan-13/judicializacao-opcao-conseguir-isencao-ipva-pcd-sp