Aposta do Ministério da Economia para facilitar a contratação de crédito, reduzir juros e aumentar a competição no sistema bancário, o projeto de lei que reforma o sistema de garantias já começa a ser alvo de articulações para modificar um ponto: a forma como serão registradas as novas operações nas Instituições Gestoras de Garantia (IGG), principal novidade da proposta.
As IGGs funcionarão como uma espécie de “open garantia”. Pessoas e empresas que desejarem poderão colocar seus bens nas IGGs e, a partir delas, contratar operações de crédito. É diferente do que ocorre hoje, quando um bem fica atrelado a um único banco e um único empréstimo, até sua quitação.
A proposta do governo prevê que um imóvel seja registrado uma só vez no IGG para dar suporte a vários empréstimos. Esse desenho foi pensado para reduzir burocracia e diminuir custos.
Mas esse formato gera uma “obscuridade”, disse ao Valor o presidente do Registro de Imóveis do Brasil (RIB), Flaviano Galhardo.
“Quando o sujeito se torna inadimplente, começam a vir para a matrícula do imóvel informações do Judiciário: penhora do imóvel, indisponibilidade, sequestro de bens”, afirmou. “Se deixarmos as informações da IGG fora da garantia imóvel, essa garantia real vai se evaporar.”
Esse risco não existe, rebateu o subsecretário de política microeconômica e financiamento da infraestrutura do Ministério da Economia, Emmanuel Sousa de Abreu. Isso porque haverá registro no cartório de imóveis em nome da IGG. “Todo aquele que procurar o cartório de registro verá que a garantia foi dada à IGG.”
A proposta do RIB é que o cartório seja informado, por meio de uma averbação eletrônica, sobre cada operação em que o imóvel é dado como garantia nas IGGs.
Galhardo destacou pontos positivos da proposta. Segundo ele, poderá triplicar o volume de imóveis financiados no país. A possibilidade de um mesmo bem servir de garantia para mais de um empréstimo por meio do fracionamento da garantia é um “avanço tremendo”, classificou.
A expectativa do governo é que o Projeto de Lei 4.188/2021, que cria as IGGs, seja aprovado no ano que vem.
A tendência é que as IGGs se especializem, segundo o secretário de Política Econômica, Adolfo Sachsida. Poderá haver aquelas focadas na gestão de garantias para microcrédito, microempresas e microempreendedores individuais (MEIs).
Um canal mais azeitado de crédito será importante principalmente porque, com a recessão e a pandemia, muitas empresas venderam seu patrimônio para sobreviver, destacou.
“Chega a 2022, quando saímos desse momento de crise, as empresas tentam obter crédito, mas não têm garantia, porque queimaram para atravessar o período de 2014 a 2020”, comentou.
Sachsida exemplificou o impacto das IGGs. Um empréstimo bancário para pessoa física pode custar 5% ao mês se não houver garantia. Se for um consignado em folha salarial, a taxa cai para 2,5% mensais. Utilizando como garantia o saque-aniversário do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), o custo recua para 1,1% ao mês. “Essa é a força das garantias”, afirmou.
A nota informativa “Serviço de Gestão Especializada de Garantias”, elaborada pela Secretaria de Política Econômica (SPE) e antecipada ao Valor, destacou que o novo marco legal pode aumentar a competição no sistema bancário e que instituições de pequeno porte terão como superar problemas de insuficiência de capital. Com isso, haverá ganho de competitividade para fintechs e plataformas “peer-to-peer”, afirmou.
Abreu disse que as fintechs têm dificuldade em entrar no mercado imobiliário, hoje concentrado na Caixa. As instituições maiores têm escala para fazer a avaliação e a gestão dos imóveis, algo que as instituições menores não conseguem. Esse problema pode ser superado com a criação das IGGs.
Haverá ganho também para os produtores rurais, observou Abreu. Segundo ele, os procedimentos para contratação das operações de crédito no setor são demorados e, por vezes, provocam atraso no plantio da safra. Com a criação das IGGs, os produtores poderão antecipar a inscrição das garantias e acelerar a liberação do crédito no banco.
A nota destacou que há potencial para crescimento do crédito no país. Aqui, os débitos das famílias equivalem a 51% da renda disponível. Na Coreia, são 185%, e na Dinamarca chegam a 253%.
Fonte: Valor Econômico, Por Lu Aiko Otta, 20/12/2021