O colegiado do Supremo Tribunal Federal concluiu recentemente o julgamento do recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida (Tema 825) e decidiu que Estados e o Distrito Federal não não possuem competência para instituir a cobrança do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCMD) nas hipóteses de doações e heranças oriundas do exterior.
Apesar da tese fixada, a maioria do colegiado aderiu à proposta de modulação dos efeitos, constante do voto do relator, ministro Dias Toffoli, para que a decisão passe a produzir efeitos a contar da publicação do acórdão, ressalvando as ações judiciais pendentes de conclusão até o mesmo momento.
Para Ivana Marcon, especialista em Direito Tributário e Planejamento Patrimonial, os efeitos dessa modulação poderão trazer insegurança jurídica e prejuízo para muitos contribuintes, especialmente para aqueles que estão discutindo em sede administrativa a incidência do ITCMD e poderão ser cobrados com base em heranças recebidas no exterior nos últimos cinco anos.
“Isso significa, que os processos administrativos em andamento ficaram excluídos da modulação dos efeitos e muitos contribuintes terão que pagar o imposto com multas corrigidas”, diz Ivana.
Embora a Constituição tenha atribuído aos Estados a competência pela cobrança desse imposto, nunca houve a criação de uma Lei Complementar Federal, exigida pela Constituição, favorecendo a criação de leis estaduais sem base jurídica.
“A decisão do STF confirma, por exemplo, o entendimento de longa data do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) na necessidade da lei complementar anterior para possibilitar a cobrança do ITCMD nessas situações, mas a modulação dos efeitos na forma decidida pelo STF pode favorecer injustiças e a arrecadação indevida desse imposto tal como praticada pelos estados atualmente”, conclui a tributarista.
Já para Gabriel Lima, tributarista do Nelson Wilians Advogados, a decisão do Supremo é importante e favorável ao contribuinte, limitando a competência legislativa concorrente dos estados quando, como no caso concreto, inexistir a Lei Complementar Federal necessária para a regular tributação.
“É necessário um cuidado especial nesses temas, pois você reconhece a impossibilidade do contribuinte reaver valores pagos de forma indevida, legitimando um ato inconstitucional do Estado”, prega.
Igor Mauler Santiago, advogado tributarista e sócio de Mauler Advogados, por sua vez, lembra que o STF autorizou a retroação da decisão apenas para as ações judiciais que discutam a qual Estado é devido o ITCMD, à vista de bitributação.
“O STF autorizou a retroação da decisão apenas para as ações judiciais que discutam (1) a qual Estado é devido o ITCMD, à vista de bitributação; e (2) a validade desse imposto, não tendo sido pago anteriormente. Primeiro, tenho que as condições são alternativas, e não cumulativas. De fato, se a ação impugna a própria cobrança, decerto não discutirá qual é o Estado legitimado a cobrar. Segundo, ao limitar a retroação às ações judiciais, o STF puniu sem razão o contribuinte autuado que ainda se encontra na esfera administrativa. Esses dois pontos merecem atenção, justificando a oposição de embargos declaratórios”, explica.
RE 851.108
Revista Consultor Jurídico, 14 de março de 2021.