Ação cível originária. Direito Administrativo, Previdenciário e Tributário. Cerne da controvérsia. Compensação financeira entre regimes previdenciários. Artigo 201, § 9º, da Constituição Federal. Lei nº 9.796/99. Imposição de obstáculos por atos normativos infralegais. Favorecimento da União e do RGPS em detrimento das unidades subnacionais e dos respectivos RPPS. Ofensa ao pacto federativo. Necessidade de equilíbrio. Preservação do interesse público. 1. Os desembolsos a título de compensação financeira a que se refere o art. 201, § 9º, da CF/88 somente serão feitos pelos regimes de origem para os regimes instituidores que se mostrem “credores no cômputo [1] da compensação financeira devida de lado a lado e [2] dos débitos pelo não recolhimento de contribuições previdenciárias no prazo legal”, segundo a Lei nº 9.796/99. 2. Para efetivamente haver os desembolsos (ou, eventualmente, a dação em pagamento de imóveis, como se dispôs na Lei nº 13.485/17), duas etapas precisam ser ultrapassadas. A primeira etapa refere-se à realização da compensação financeira previdenciária devida de lado a lado. Nesse ponto, importam os valores de natureza administrativo-previdenciária que um regime tem em face do outro, e não os de natureza tributária. A segunda etapa consiste na possibilidade de se utilizar o crédito remanescente da etapa anterior a favor de um regime instituidor para se abater, caso exista, débito de contribuição previdenciária do respectivo ente federado. 3. O Decreto nº 3.112/99, com as alterações promovidas pelo Decreto nº 6.900/09, ao limitar a autonomia dos regimes que vão celebrar o acordo de parcelamento autorizado na Lei nº 9.796/99, acaba por retirar a eficácia da disposição legal. O decreto, sob o argumento de realizar uma “autolimitação” apenas para o INSS, instituiu regras que criaram benefício para o RGPS e demasiado ônus para o RPPS dos entes federativos (que vão receber, em módicas prestações, os valores aos quais têm direito), quebrando, dessa forma, o pacto federativo. 4. A Portaria Conjunta PGFN/RFB/INSS nº 1/2013, ao dispor sobre a possibilidade de compensação prévia ao desembolso dos valores da compensação financeira, regulou a compensação de ofício no interesse exclusivo da União e do RGPS, e impôs restrições não constantes quer da Constituição Federal, quer da Lei nº 9.796/99. Não permitir o encontro de contas também no interesse do RPPS dos estados, dos municípios e do Distrito Federal resulta em quebra do pacto federativo. 5. No sistema de compensação financeira entre regimes previdenciários, o que deve prevalecer não é o interesse de um ou de outro regime, nem dessa ou daquela unidade federada, mas sim o interesse público, que se expressa, em especial, nas sadias concessões e manutenções dos benefícios previdenciários, seja qual for o ente da federação responsável por eles. 6. O débito de contribuição previdenciária identificada como cota do segurado não pode compor os valores objeto da compensação autorizada por meio da tutela de urgência. O Estado de São Paulo (incluídas suas fundações e autarquias) não figura como contribuinte dessa exação, mas simplesmente como retentor. Isto é, o tributo é devido, propriamente, pelo segurado. 7. Ação cível originária julgada parcialmente procedente, declarando-se: a) o direito de o Estado de São Paulo compensar débito de contribuição previdenciária devida por ele ou por suas autarquias e fundações com o crédito que o RPPS paulista tem em face do RGPS advindo de estoque de compensação financeira previdenciária; b) a ilegalidade das alíneas a e b do inciso I do art. 14-A do Decreto nº 3.112/99, incluído pelo Decreto nº 6.900/09. 8. Ficam os réus condenados a pagar aos autores honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 3º, I, e § 4º, III, do Código de Processo Civil. 9. Ficam prejudicados os agravos regimentais. ACO 2086 / DF, DJ 02-12-2019.