Norma altera regras que levavam a Receita Federal a autuar as empresas.
A Medida Provisória (MP) 905, que criou o Programa Verde e Amarelo, pode resolver uma das principais quedas de braço entre empresas e Receita Federal no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). A norma altera a legislação dos planos de Participação nos Lucros e Resultados (PLR) e altera pontos considerados cruciais para livrar as companhias das condenações que impõem pagamento de contribuição previdenciária sobre os valores distribuídos aos funcionários.
O governo estima que as mudanças no PLR e prêmios não terão impacto fiscal. Mas instituições financeiras travam disputas bilionárias no Carf e na Justiça por esse motivo. O orçamento é um ponto importante para a MP, já que permite a tributação de desempregados para compensar a desoneração do programa de estímulo ao emprego de jovens.
A tributação do PLR é uma das prioridades da Receita e está frequentemente na pauta do Carf. De 2015 para cá foram publicados mais de 320 acórdãos sobre o assunto – a maioria com decisão contrária às empresas.
A justificativa para os autos de infração é a de que as empresas não seguem os critérios estabelecidos para a isenção. Entre eles, os que exigem a assinatura do acordo (entre empregados e empregador) no ano anterior ao do benefício e regras claras e objetivas ao plano.
Esses dois pontos constam na MP 905. Por isso, há chance de livrar as empresas de novas autuações. Segundo consta no texto, o plano deve ser assinado antes do pagamento e não, necessariamente, no ano anterior. “Está mais condizente com a realidade do mercado”, diz o advogado Pedro Ackel, do escritório WFaria. “Não faz sentido a empresa assinar o acordo quando ainda nem fechou o ano e não tem bem definidas as metas para o próximo.”
Sobre as regras “claras e objetivas”, a MP 905 diz que deve prevalecer a autonomia da vontade dos contratantes perante o interesse de terceiros. “Se empresa e empregado, por meio de comissão paritária ou acordo coletivo, definirem as regras não caberá ao Fisco alegar discordância para descaracterizar o plano, como ocorre hoje”, diz Leandro Cabral, do escritório Velloza.
A MP 905 amplia o uso do PLR, permitindo que entidades imunes tenham programas. Além disso, desobriga a participação do sindicato na negociação, realizada em comissão paritária de empregados e empresa. “Um dos grandes entraves desde o fim da contribuição obrigatória para o sindicato é convidá-lo para as negociações”, afirma Caio Taniguchi, do Simões Advogados.
As previsões da MP estão em linha com a jurisprudência antiga do Carf, alterada em 2016, com a deflagração da Operação Zelotes. Nos últimos anos, as empresas têm perdido os processos sobre o assunto no órgão.
Em julho, a 2ª Turma da Câmara Superior – última instância do Carf – manteve cobrança de R$ 529 milhões do Itaú Unibanco sobre PLR e bônus de contratação pagos entre 2007 e 2008. Considerou que os planos não tinham regras claras e objetivas. O banco tem outro processo sobre o tema no Carf, no valor de R$ 1,2 bilhão, referente a 2009 e 2010, que aguarda julgamento.
O BTG e suas controladas são parte em 39 processos relativos ao pagamento de PLR. O valor envolvido é de R$ 608,9 milhões. O Santander recebeu autuações no valor de R$ 5,4 bilhões. Os casos são discutidos nas esferas administrativa e judicial.
O secretário de Trabalho do Ministério da Economia, Bruno Dalcolmo, diz que os ajustes feitos na legislação por meio da MP têm como objetivo deixar claras as regras e situações em que o resultado da empresa e cumprimento de metas ficam acima do “ordinariamente esperado”. Segundo ele, a Receita e a Justiça não estavam interpretando de forma correta o texto da reforma trabalhista, o que resultou em aumento de judicialização.
Segundo Dalcomo, ao tratar de PLR e prêmios na MP, o governo esclarece, por exemplo, que as metas e resultados devem ser definidas previamente, mediante acordo entre empregados e empregador.
A medida provisória, segundo advogados, também dá maior segurança para o pagamento de prêmios. “Geralmente a PLR é feita para todo um departamento e no prêmio você mede empregado por empregado”, afirma Fabio Medeiros, do escritório Lobo e De Rizzo.
O pagamento de prêmio ocorre por algum trabalho com desempenho superior do empregado e deixou de ser considerado salário a partir da reforma trabalhista de 2017, o que afastou encargos trabalhistas e previdenciários. Mas desde a reforma havia insegurança sobre o que seria o desempenho “superior ao ordinariamente esperado”, previsto na norma.
A Receita chegou a se posicionar sobre o assunto na Solução de Consulta nº 151, deste ano, e restringir a aplicação. A premiação deveria ser esporádica e sem estar prevista na contratação. Agora, a MP autoriza o acordo prévio e estabelece que as regras estabelecidas devem ficar arquivadas por até seis anos.
A MP também aumenta a segurança sobre a não tributação do auxílio-alimentação. O texto afirma que, independente da forma de pagamento – vale, ticket, cupom ou cheques -, não tem natureza salarial nem é tributável. Até dezembro de 2018, a Receita entendia que o pagamento por ticket e cartões era equivalente a dinheiro e, por isso, poderia ser tributado. Em janeiro, afastou a tributação.
FONTE: Valor Econômico – Por Beatriz Olivon, Joice Bacelo e Edna Simão — De Brasília – 13 de novembro de 2019