Startups são um nicho em plena expansão no Brasil. Somente no ramo jurídico, são pelo menos 200 lawtechs e legaltechs até o momento. São empresas que usam novas tecnologias para a entrega de serviços jurídicos, aumento de eficiência e melhora na prestação de tais serviços. Entretanto, o nicho carece de regulação. Necessária a atualização do ordenamento jurídico para contemplar o ramo de modo a haja o seu fomento.
Conforme este raciocínio, na última terça-feira (13/12), aprovou-se na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei Complementar 420/2014, de autoria do deputado Pedro Eugênio. O relatório recém aprovado, do deputado Otavio Leite, contempla um novo regime diferenciado, o Inova Simples.
A matéria vai ao Senado Federal, onde pode, ou não, sofrer alterações. Dessa forma, atentaremos ao PL 420/14 aprovado na Câmara Federal. Este projeto altera a Lei Complementar 123, de 14 de dezembro de 2006, que instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte.
Destaca-se a alteração pretendida pelo PL 420/14 na Lei 123/06, em seu Capítulo X – Do Estímulo à Inovação. Mais especificamente na Seção II, que passaria a ser denominada “Do Apoio à Inovação e do Inova Simples da Empresa Simples de Inovação”
Busca-se inserir nesta sessão o art. 65-A, que possuiria nada menos que 13 parágrafos. Reproduz-se a redação do caput desse artigo aprovado na Câmara Federal:
Art. 65-A. Fica criado o Inova Simples, regime especial simplificado que concede às iniciativas empresariais de caráter incremental e/ou disruptivo, que se autodeclarem como startups ou empresa de inovação, tratamento diferenciado com vistas a estimular sua criação, formalização, desenvolvimento e consolidação como agentes indutores de avanços tecnológicos e da geração de emprego e renda.
Assim sendo, será considerada startup a empresa de caráter inovador que visa a aperfeiçoar sistemas, métodos, modelos de negócio, de produção, de serviços ou de produtos. Estes, quando já existentes, configuram startups de natureza incremental e quando relacionados à criação de algo inovador, serão configuradas startups de natureza disruptiva.
Em outras palavras, natureza disruptiva ou inovação disruptiva é algo inovador, que traga inovação a um setor, produto ou serviço, que provoque a ruptura nos padrões já existentes no mercado. Não necessariamente a inovação signifique algo novo e sim um projeto inovador, que traga inovações ao setor, em um ramo já existente. Vejamos o exemplo da Apple, quando desenvolveu o iPhone, o celular já existia. Porém, apenas se inovou o setor de telefonia. Diferentemente do que ocorreu com o Ipad, que foi algo novo, iniciando a era dos famosos tablets.
O empreendedor do ramo e sua iniciativa se caracterizam por desenvolver novos modelos de negócios em condições de incerteza. Sendo necessários experimentos e validações constantes, com comercialização experimental provisória, com posterior obtenção de receita através de comercialização plena.
O tratamento diferenciado a estes empreendedores consistirá em rito sumário para abertura e fechamento da empresa Inova Simples. Algo que se dará de forma simplificada e automática, no mesmo ambiente digital do portal da Rede Nacional para Simplificação do Registro da Legalização de Empresas e Negócios (Redesim)
Titulares da empresa Inova Simples preencherão as informações cadastrais básicas, com as seguintes informações: (a) qualificação civil, domicílio e CPF; (b) descrição do escopo da intenção empresarial inovadora e definição da razão social, que deverá conter obrigatoriamente a expressão “INOVA SIMPLES (I.S.)”; (c) auto declaração, sob as penas da lei, de que o funcionamento da empresa Inova Simples não produzirá poluição, barulho e aglomeração de tráfego de veículo; (d) definição do local da sede, que poderá ser comercial, residencial ou de uso misto, inclusive com possibilidade de instalar-se onde funcionam parques tecnológicos, instituições de ensino, empresas juniores, incubadoras, aceleradoras e espaços compartilhados de trabalho na forma de coworking; (e) informação, em caráter facultativo e em campo próprio, sobre a existência de apoio ou validação de instituto técnico, científico ou acadêmico, institucional ou privado, bem como de incubadoras, aceleradoras e instituições de ensino, nos parques tecnológicos e afins.
Havendo o devido fornecimento de informações, será gerado automaticamente número de CNPJ específico. Isto, em nome da denominação da empresa Inova Simples, em código próprio.
Determina-se que a empresa Inova Simples deverá abrir, imediatamente, conta bancária de pessoa jurídica, para fins de captação e integralização de capital. Podendo ser provenientes de aporte próprio de seus titulares, de investidor-anjo ou de investidor domiciliado no exterior.
No que tange à propriedade intelectual, haverá comunicação automática ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) do conteúdo inventivo do escopo da inciativa empresarial. Sem prejuízo de o titular providenciar os registros de propriedade intelectual e industrial diretamente, de modo próprio, no INPI. O instituto deverá criar mecanismo que encadeie desde a recepção dos dados ao processamento sumário das solicitações de marcas e patentes de empresas Inova Simples.
O PL 420/14 dispõe que será permitida a comercialização experimental do serviço ou produto até o limite fixado para o MEI. E que na eventualidade de não lograr êxito no desenvolvimento do escopo pretendido, a baixa do CNPJ será automática. Ficando responsáveis os titulares, nas pessoas físicas, por dívidas ou passivos de qualquer natureza a que tenham anuído solidariamente nos casos de fraude, dolo ou confusão patrimonial.
Sem dúvidas é um grande avanço para o mundo dos empreendedores e das Startups, aumentando as formas de inovar no Brasil.
Sabemos que o processo legislativo seguirá seu rumo constitucional, podendo existir modificações no projeto de lei em comento.
Contudo, possível é promissora a alteração legal na forma do Projeto de Lei 420/14. É a inovação legal permitindo inovação tecnológica. Estamos finalmente avançando no setor tecnológico, um primeiro passo para o futuro.
Por Afonso Códolo Belice e Flavio Kiyoshi Yamauchi
Afonso Códolo Belice é advogado, sócio do escritório Belice Advocacia. Assessor jurídico na Câmara dos Deputados. Professor universitário. Mestre em Direito Constitucional.
Flavio Kiyoshi Yamauchi é advogado, membro da Associação Brasileira de Lawtechs e Legaltechs (AB2L). Sócio de BBPY Advogados Associados.
Revista Consultor Jurídico, 15 de dezembro de 2018.
https://www.conjur.com.br/2018-dez-15/opiniao-camara-deputados-aprova-inova-simples-startups