A disputa entre os estados da federação por investimentos oriundos do setor privado a partir da concessão irregular de incentivos fiscais parece ter uma perspectiva de resolução. Isso porque foi editada a Lei Complementar 160/2017, norma que dispõe sobre a convalidação e prorrogação de incentivos fiscais concedidos unilateralmente, sem a chancela do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) pelos estados brasileiros.
A denominada guerra fiscal sempre ocorreu porque os estados, em nome da busca pelo desenvolvimento regional, concediam benefícios fiscais relativos ao ICMS sem a deliberação conjunta através de convênio celebrado no âmbito do Confaz, o que constitui afronta à Constituição Federal e à Lei Complementar 24/1975.
Dessa forma, a maioria desses incentivos teve sua inconstitucionalidade reconhecida em diversas ações propostas perante o Supremo Tribunal Federal, o qual, em respeito ao direito adquirido e à segurança jurídica, se viu obrigado a reconhecer a vigência temporária dessas leis problemáticas, por meio do instrumento da modulação dos efeitos da decisão.
Após longos anos de debates judiciais e administrativos, o Congresso Nacional finalmente tratou de regular o tema e editou a LC 160. A norma dispõe sobre a celebração de convênio entres os estados e o Distrito Federal para deliberação sobre a remissão (perdão do débito fiscal) de créditos decorrentes de benefícios fiscais instituídos irregularmente pelos entes da federação até 8 de agosto de 2017. Sem delongas, o Confaz celebrou o Convênio ICMS 190/17, que trata do assunto.
Segundo o convênio, os estados deverão publicar uma lista com todos os atos normativos relativos aos incentivos fiscais instituídos irregularmente até 8 de agosto de 2017. Essa publicação deverá ocorrer até 29 de março de 2018, para os atos vigentes, e até 30 de setembro de 2018, para os atos não vigentes. Dessa forma, apenas os créditos tributários de ICMS decorrentes dessas normas serão remitidos e anistiados. Por outro lado, as normas concessivas dos benefícios que ficarem de fora da lista deverão ser revogadas até 28 de dezembro de 2018 pela unidade federada concedente.
Caso o estado ou o Distrito Federal queira reinstituir os incentivos fiscais editados até 8 de agosto de 2017 e que ainda estejam vigentes em 2018, deverá publicar nova lei estadual ou distrital, devendo informar ao Confaz sobre a prorrogação dos incentivos. Porém, tais benefícios terão prazo de validade específico, a depender do ramo de atividade, podendo ser usufruídos pelos contribuintes até, no máximo, 31 de dezembro de 2032.
Ponto positivo para os estados e os contribuintes é que a LC 160 permitiu que os entes aderissem aos programas de incentivos fiscais elaborados por outra unidade federada da mesma região, sem precisar de autorização do Confaz. Nesse sentido, uma empresa sediada no Piauí poderá usufruir de benefício fiscal concedido pelo Maranhão, desde que o ato concessivo já tenha sido convalidado nos termos do Convênio ICMS 190/17.
Para aquelas empresas que já estão sendo cobradas administrativamente por créditos de ICMS decorrentes de leis concessivas de incentivos fiscais, caberá desistir de impugnações, defesas e recursos nas esferas administrativa e judicial para que possam usufruir do perdão de seus débitos fiscais.
Entretanto, tal medida deverá ser adotada com cautela pelos contribuintes, uma vez que a convalidação dos incentivos depende de publicação da norma pelo estado concedente, que poderá fazê-lo ou não. Caso o ente convalide o benefício, desiste-se dos processos, arca-se com os honorários sucumbenciais e frui-se o perdão do débito. Caso contrário, deve-se aguardar o período para convalidação, sem abrir mão dos processos em curso.
No âmbito administrativo, o contribuinte deverá requerer o sobrestamento do feito até o fim do prazo para convalidação do incentivo ou sua revogação, isto é, até 28 de dezembro de 2018. Esse mecanismo, apesar de não estar previsto no Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), já foi aplicado anteriormente pelo órgão paritário.
De igual modo, para os contribuintes que discutem judicialmente a cobrança de débitos tributários decorrentes de incentivos fiscais, caberá o requerimento de suspensão do processo, com base no artigo 313 do Código de Processo Civil, uma vez que a sentença de mérito só poderá ser proferida após a verificação da convalidação ou não do incentivo fiscal em debate.
Vê-se que boa parte do “acordo de paz” da guerra fiscal depende da atuação dos estados e do Distrito Federal, o que permitirá que todos, entes e contribuintes, saiam vitoriosos.
Por Alline Aguiar Soares Couto
Alline Aguiar Soares Couto é advogada tributária do Nelson Wilians e Advogados Associados.
Revista Consultor Jurídico, 17 de março